O Diário Oficial do Distrito Federal de hoje (6) traz publicado o decreto nº 36.794/2015, que institui a Comissão Técnica de Articulação Interinstitucional para a Política Cicloviária. À comissão caberá "promover a ação coordenada dos órgãos de governo que atuam na política cicloviária" do DF, diz o texto.
Por ora, nenhuma entidade da sociedade civil foi convidada a participar, e o decreto apenas afirma que as entidades poderão ser chamadas, "conforme o assunto a ser tratado". Ainda, a comissão tem prazo de 60 dias para "definir mecanismos de participação da sociedade na implementação da política cicloviária".
Para compor a comissão, foram convocados representantes dos seguintes órgãos do DF: Secretaria de Mobilidade Urbana - Semob, Secretaria de Gestão do Território e Habitação - Segeth, Secretaria de Infraestrutura e Serviços Públicos - Sinesp, Departamento de Estradas de Rodagem - DER/DF, Departamento de Trânsito - Detran/DF; Transporte Urbano do DF - Dftrans, Companhia do Metropolitano - Metrô/DF, Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil - Novacap e Companhia de Planejamento do DF - Codeplan.
Decretos e mais decretos
Um histórico ajuda a entender qual o problema de mais uma comissão. Deve-se saber, por exemplo, que o novo decreto revogou o anterior, de nº 34.530/2013, que havia instituído o ‘Fórum da Política de Mobilidade por Bicicletas no Distrito Federal’. Este, por sua vez, revogou o decreto nº 333.158/2011, que criou o ‘Comitê Gestor da Política de Mobilidade Urbana por Bicicletas no Distrito Federal’ e que, mais uma vez, revogou o decreto nº 332.245/2010, que criou o ‘Comitê de Política de Implantação de Ciclovias na Malha Viária do Distrito Federal’. E assim vai...
Então, o que se discute é que a prática adotada pelos sucessivos gestores do governo do DF (GDF) desrespeita os decretos criados por eles próprios. Desrespeita, apesar de tantos decretos, de tantos mecanismos que em tese poderiam garantir a articulação governamental e a participação popular nas definições dos rumos da política cicloviária do DF.
Tanto é que, desde 2010, ano em que o primeiro decreto citado entrou em vigor, a sociedade civil nunca conseguiu influenciar objetivamente os rumos da política cicloviária. Da mesma forma, a crítica dos cicloativistas é que o GDF "não consegue definir um objetivo e falar a mesma língua em todas suas instâncias".
Em 2010, o comitê instituído, que previa duas vagas para a sociedade civil, nunca tomou posse. Em 2011, um novo comitê, foi a vez do "Comitê Gestor" com nome pomposo e seis vagas para a sociedade civil. Mas, apesar da legislação e do próprio nome definir o seu caráter de gestão, com a incumbência de definir metas, indicadores, planejamento, articulação e supervisão, também este comitê nunca exerceu a sua atividade fim. A sociedade civil era ouvida, mas não conseguia influenciar as decisões do governo relativas a mobilidade por bicicleta, que eram tomadas em outras esferas fora de sua alçada. Tendo, inclusive, o Ministério Público questionando e cobrando a efetivação da legislação por diversas vezes.
Em 2013 também este comitê foi extinto e substituído pelo Fórum, um espaço que permitiu a participação da sociedade civil somente em “caráter extraordinário” e “mediante convite”, conforme determinado em decreto.
Agora, novo governo, nova gestão, novas promessas e novos decretos. Fica a expectativa de que, finalmente, depois de anos, a sociedade civil seja de fato ouvida e tenha seus anseios atendidos no que se refere a mobilidade por bicicleta.
Apesar de tantos decretos poderem refletir avanços e amadurecimentos, eles, na verdade, demonstram uma incapacidade dos gestores públicos de articular seus diversos órgãos nas definições e implantação das políticas públicas do DF, não só na área cicloviária. Não deveriam ser necessários decretos do poder executivo para que os seus próprios órgãos, secretarias e autarquias tenham um objetivo em comum e atuem em conjunto.
A participação da sociedade civil é muito importante neste processo, pois é ela que cobra e expõe as fragilidades do governo. Mas, enquanto internamente o GDF não conseguir definir uma linha de ação articulada internamente, a impressão geral é que a sociedade continuará sendo desconsiderada, e que de nada adianta falar se não houver do outro lado quem de fato ouça.
Por outro lado, os diversos coletivos, movimentos e associações precisam se articular, superar rivalidades para, juntos, levarem suas demandas aos governantes.
Para além dos decretos como estes, que se referem à questão da mobilidade por bicicleta, o Conselho de Mobilidade, definido no Estatuto da Cidade e na Política Nacional de Mobilidade Urbana, nunca existiu de fato no DF.
Portanto, ainda que este novo decreto seja efetivado e dê certo, a mobilidade no DF continuará sendo pensada em caixinhas e não na sua totalidade.
Confira na integra o decreto que cria a Comissão Técnica de Articulação Interinstitucional para a Política Cicloviária do DF (nº 36.794/2015) na página 4 do Diário Oficial.
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