Em função dos debates em torno da proposta de redução de velocidade nas avenidas expressas da capital paulista, a Comissão Técnica de Mobilidade a Pé da ANTP divulgou nesta semana um documento no qual apresenta argumentos para apoiar a decisão da prefeitura nas avenidas Marginais, Jacu-Pêssego e Aricanduva.
Reproduzimos, na íntegra, o texto já publicado no site da associação técnica.
"O relatório de acidentes de trânsito realizado anualmente pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) de São Paulo acusou um expressivo aumento no número de óbitos em acidentes de trânsito e atropelamentos em 2014. Como medida de combate a este aumento a Secretaria de Transportes da Prefeitura de São Paulo (SMT) deu continuidade a um programa de desaceleração do tráfego em vias paulistanas já iniciado em 2011, na gestão anterior, reduzindo as velocidades das avenidas marginais aos rios Tietê e Pinheiros para 50 km/h na pista local e para 60 e 70 km/h na pista do meio (onde existir) e na pista expressa, respectivamente.
A redução da velocidade da pista local para 50 km/h atende aos requisitos básicos para reduzir as 24 mortes por atropelamento registradas em 2014 nas duas avenidas e que junto com o total de 46 óbitos de trânsito ocorridos nos acidentes veiculares totalizam índices assustadores de 70 vidas perdidas somente nestas duas avenidas no ano passado.
Estas avenidas que recebem várias denominações ao longo de seu trecho e construídas nas décadas de 1950 a 1970 com padrões rodoviários, tinham por função inicial estabelecer uma ligação das várias rodovias que chegavam nas franjas da cidade onde estavam situadas, apoiando a logística de circulação de cargas.
Entretanto, ao longo dos anos, foram engolidas pela ampliação da mancha urbana e deixaram há muito de perimetrar os extremos da cidade, compondo com outras duas avenidas o que se denomina de “Centro Expandido”, ou seja, contornam uma expansão do que antes era considerado Área Central. Assim, as características de rodovia perderam totalmente o sentido e passaram a representar um grande problema para a cidade: as saídas das marginais para as vias coletoras e até mesmo locais raramente propiciavam a adequada redução da velocidade, provocando efeitos adversos estendidos pela cidade.
Da mesma forma, o desenho rodoviário com que foram projetadas e implantadas inicialmente as avenidas marginais passou a sofrer todo o tipo de adaptações possíveis para abrigar shoppings centers, grandes lojas varejistas, supermercados, prédios de escritórios, todos com entradas voltadas para as pistas e alças das avenidas, e grandes geradores de viagens a pé.
Este processo de transformação de uso e ocupação de solo também foi acompanhado por infraestrutura de transporte público coletivo e individual e assim, as geometrias das alças das pontes foram redesenhadas para acomodar baias que viriam junto com os pontos de parada de ônibus e taxis.
Toda essa transformação urbana criou demandas de viagens a pé cada vez mais numerosas ao longo das calçadas das pistas e alças destas avenidas e o que é mais crítico: altos fluxos de travessias a pé de suas alças, extremamente arriscadas pelas condições de dificuldade na intervisibilidade pedestre X motorista, falta de brechas no tráfego volumoso e velocidade elevada e, portanto, impossíveis de serem apoiadas por equipamento semafórico.
Para complementar ainda mais esta situação os mais de 300 km de rede cicloviária implantados em toda a cidade também incluíram nos seus trajetos travessias das alças das pontes e, portanto, intensificando esta demanda nas mesma dificuldade de condições impostas às travessias a pé.
Consequentemente, toda e qualquer ação de redução de velocidade veicular é muito bem-vinda como medida para oferecer à Mobilidade a Pé - responsável por 1/3 de todas as viagens cotidianas da cidade - a relevância que ela merece. Adotar 50 km da velocidade nas pistas locais das avenidas marginais implica também a redução imediata da velocidade veicular nos locais onde estão grande parte das travessias dos pedestres.
Por fim, ressalta-se que a medida integra uma política de segurança viária que visa a preservar vidas. O trânsito, em condições seguras, é um direito de TODOS , conforme meta apontada no Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Logo o programa da redução da velocidade, na verdade, visa um contexto muito maior que aborda o (re)desenho das cidades ao atingir uma regulamentação que dá preferência à vida e a uma cidade mais equilibrada e harmoniosa a todos, pois, morte no trânsito, definitivamente, não é acaso - mas sim tragédia anunciada - e portanto pode e deve ser evitada.
Em âmbito maior, esta ação atende a um programa acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS, 2009) os acidentes no trânsito matam cerca de 1,3 milhão de pessoas por ano no mundo. E, se nada mudar, em 2020, esse número pode atingir 1,9 milhão de mortes anualmente. Assim, a ONU lançou em 2011 a década de Ação pelo Trânsito Seguro (2011-2020) e vários estados brasileiros são parte desse programa, inclusive São Paulo. No entanto, as estatísticas de 2014 supracitadas mostram que ainda há muito a fazer para que alcancemos as metas estipuladas pela ONU.
A partir das considerações apresentadas neste manifesto, a Comissão Técnica de Mobilidade a Pé e Acessibilidade da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), cujo objetivo é o conhecimento e o debate das políticas públicas voltadas à priorização da forma mais primordial de deslocamento em todas as cidades brasileiras, apoia de forma irrestrita o programa de redução da velocidade veicular colocado em prática pela Prefeitura Municipal de São Paulo."
Referências:
CET, Companhia de Engenharia de Tráfego, Acidentes de Trânsito Fatais - Relatório Anual, 2014. Disponível em: <http://www.cetsp.com.br/media/395294/relatorioanualacidentesfatais2014.pdf > Acesso em: Jul. 2015.
OMS, Organização Mundial Da Saúde, Global status report on road safety 2009. Disponível em: < http://www.who.int/violence_injury_prevention/road_safety_status/2009/en/ > Acesso em: Jul. 2015.
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