A Prefeitura de São Paulo retomou, nessa segunda-feira, a discussão sobre a renovação das licitações para o transporte público municipal. As novas contratações de empresas para explorar o serviço dos ônibus na cidade valerão pelos próximos 20 anos e chegam a valer 120 bilhões de reais.
Os contratos venceram em 2013, mas, após as manifestações de junho explodirem pela cidade naquele ano, tendo a tarifa do transporte como estopim, o prefeito Fernando Haddad resolveu frear o processo. Alegou que não poderia “assinar os contratos sem a participação popular”. Na época, a Prefeitura decidiu estender o prazo final da licitação até que fosse feita uma audiência para diagnosticar as principais falhas no serviço. Uma das reivindicações dos protestos também era pela realização de uma auditoria que investigasse as principais falhas no sistema, o que foi feito no ano passado.
Audiência pública
Na primeira – e muito possivelmente única – audiência pública realizada para a discussão das diretrizes do novo edital de contratação, o secretário dos Transportes, Jilmar Tatto, foi pressionado pela categoria. Houve acusações por parte de motoristas e cobradores, principalmente os que eram das antigas cooperativas de transporte, agora transformadas em empresas. “Secretário, precisamos da sua ajuda”, dizia um dos representantes em um plenário abarrotado de gente.
As demandas eram em relação à fiscalização dos salários de motoristas e cobradores, à garantia de que cobradores não seriam demitidos e ao aumento do repasso para as ex-cooperativas. Segundo Tatto, “o cobrador não vai acabar”. Já os repassos e demais demandas “serão discutidos no edital”, que deve ser publicado entre abril e maio.
Participação internacional
Um dos pontos mais tensos da discussão desta tarde foi o fato de que o edital estará aberto para a concorrência internacional. “O estrangeiro é mais honesto que a gente, secretário?”, gritou um dos participantes. “Queremos sinalizar que em São Paulo, pelo tamanho do contrato e por ser uma concessão de longo prazo, também poderão participar empresas estrangeiras”, afirmou Tatto. “Essa é uma recomendação, inclusive do Tribunal de Contas da União e do Ministério Público”. O plenário vaiou. ‘Traíra’, ‘safado’ e ‘ladrão’ foram as palavras dirigidas ao secretário. “Vamos ser obrigados aprender a falar inglês?”, perguntou um deles, sob aplausos e risos, inclusive de Tatto.
“Se uma empresa de fora ganhar, ela terá por obrigação contratar os profissionais que já estão trabalhando ali”, disse Tatto. “Nós vamos garantir que os trabalhadores não percam seus empregos”, garantiu. “O secretário está o que?”, perguntou um dos motoristas que estavam ali. “Mentindo!”, gritaram vários. Além de trabalhadores e donos das ex-cooperativas de transporte, havia representantes dos empresários do ramo no plenário. Eles não costumam se identificar.
Os detalhes mais importantes da nova licitação não foram divulgados por Tatto. Margem de lucro, percentual de subsídio da prefeitura, critérios para vencer a licitação e se a frota de ônibus aumentará ou não, “também estarão no edital”, segundo o secretário. A audiência pública é requerida por lei federal para que uma licitação como essa seja realizada.
A última licitação foi realizada em 2003, também por uma gestão petista, quando Marta Suplicy era a prefeita da cidade. Desde então, oito consórcios, 22 empresas e nove cooperativas exploram as linhas da cidade. Hoje, 10 milhões de pessoas são transportadas diariamente em São Paulo.
Enquanto isso, a população espera (Foto: Thays Bittar)
Auditoria externa
A auditoria pública, realizada pela Ernst & Young no ano passado, detectou que 10% das viagens que as companhias afirmavam fazer, não eram realizadas. Isso faz com que as empresas economizem 1 milhão de reais por dia, ou quase 400 milhões ao ano. Segundo a Ernst & Young, a Prefeitura poderia economizar 7,4% se essas viagens fossem, de fato, feitas. Outras irregularidades, como a ausência de itens de segurança e de ferramentas nos ônibus, também foram detectadas. A auditoria concluiu que a taxa de retorno do lucro das empresas era de 18%, enquanto muitos contratos públicos realizados nos últimos anos no país, segundo a EY foi de 7% a 12%.