Como é sabido, comprar um carro não é um investimento barato (especialmente no Brasil) e, tampouco, sua manutenção. Combustível, IPVA, seguro, estacionamento etc. - se colocarmos tudo no papel, fica difícil fechar a conta no final!
Todos os anos são batidos recordes e mais recordes de congestionamento... O transporte público, embora tenha melhorado com medidas como o corredor de ônibus, ainda está muito aquém de ser considerado um serviço público universal e de qualidade. Perdemos tempo, saúde e dinheiro com um sistema voltado ao transporte individual.
O tempo de deslocamento gasto associa-se diretamente ao bem-estar e qualidade de vida dos cidadãos, uma vez que, ao se perder mais tempo nos deslocamentos diários, diminui-se o tempo dedicado a práticas esportivas e de lazer.
Correr, para ganhar tempo!
Há três anos uso a corrida como meio de transporte para o trabalho e outros compromissos. Foi a forma que encontrei para otimizar tempo e, assim, continuar treinando. Antes de aderir a esta nova rotina, para percorrer quase 8 km utilizando transporte público, levava cerca de 1h20 (trajeto e baldeações). Se tivesse carro, impossível saber o tempo exato. Correndo, levo 45 minutos!
Para contextualizar, a velocidade média de um corredor de rua amador pode atingir entre 8 e 13 km/h. Já a velocidade dos veículos nos horários de pico (manhã e noite), de acordo com as medições da CET, varia de 7 a 15 km/h (números espantosos, não?).
O lado econômico também é destacado: economizo com transporte público cerca de R$ 150,00/ mês. Além dos benefícios imensuráveis, como o prazer da liberdade de ir e vir, sem estresse, sem enclausuramentos, sentindo o vento agradável no rosto. Nem a chuva atrapalha, ao contrário, refresca quando cai e lava a alma!
Sou pesquisadora em meio ambiente e não tenho uma agenda semanal fechada. Vou encaixando a corrida em minha rotina de um modo muito simples: (i) para a universidade mais perto de minha residência – cerca de 8 km - vou e volto correndo; (ii) já à universidade mais distante – 40 km – vou de transporte público e, na volta, desço no centro da cidade e encerro o trajeto correndo; (iii) nos dias que dou aulas em uma universidade próxima à Avenida Paulista, por se tratar do período noturno, vou correndo e volto de metrô.
E assim vai...
Importante ressaltar que não sou atleta profissional (e nem pretendo ser - risos). Sou uma pessoa “comum” que opta por se deslocar por meio da corrida.
Quando chego aos locais e digo às pessoas que usei minhas próprias pernas para me locomover, as reações são diversas. Vão desde “nossa, que fantástico” até “nossa, você é louca”. Aos que acham loucura, sim, existem riscos: problemas nas calçadas, cruzamentos, iluminação, sinalização, falta de segurança etc. Contudo, se esperarmos as perfeitas condições para realizarmos alguma mudança em nossas vidas, dificilmente sairemos do lugar, certo?
![](http://www.mobilize.org.br/handlers/ImagemHandler.aspx?img=corrida-urbana.jpg&t=7&w=780&h=485)
Sílvia Cruz na volta para casa: a liberdade de quem corre! Foto: Corridaamiga
Tá bom! Mas... E como você faz? As pessoas não percebem que você chegou correndo? Qual a logística?
Vamos lá, seguem algumas dicas:
1) Organize a mochila, levando o mínimo possível. A minha pesa uns 2 kg, contendo geralmente: roupas de tecido que não amassam; sandálias; bolsinha com desodorante, hidratante corporal e creme para pentear em frascos pequenos, kit básico de maquiagem, toalha de rosto (pode substituir por fralda de pano que é mais leve), celular, carteira com documentos pessoais, pote plástico com frutas.
2) Coloque sempre tudo em sacolas plásticas. Conserva e organiza melhor os itens que está levando além de proteger da chuva.
3) Quem não tem vestiário no trabalho (ou o 'Aro 27 Bike Café' e o 'Dress Me Up' por perto) vale fazer um “banho de gato”. Umedecer uma toalha de rosto e lenços umedecidos garantem a higiene. Caso não se acostume com a ideia, realize somente o trajeto de volta para casa e vá de transporte público, carona, táxi...
4) Trajeto: planeje e estude bem as alternativas de rotas antes de sair de casa. Não necessariamente fará correndo o mesmo trajeto que realiza de carro.
5) Chegue, no mínimo, 30 minutos antes do seu compromisso. É um tempo suficiente para resfriar o corpo, descansar e fazer tudo com calma.
Deixar o carro em casa e realizar os deslocamentos diários de outras formas (seja caminhando, correndo, pedalando, patinando, de skate, utilizando transporte público) passa, fundamentalmente, por uma mudança de comportamento e mentalidade (essa ainda é a maior barreira).
Outro fato que pude comprovar de perto: modos de transporte ativo nos despertam outra percepção da cidade, notam-se diferentes paisagens que não são possíveis perceber de dentro dos carros. E isso muda a nossa relação com a cidade, nos aproxima e nos faz querer cuidar mais dela.
Para aqueles que se inspiraram a driblar, ou melhor, a se libertar do trânsito também, fica o convite!
*Silvia Stuchi Cruz é doutoranda pelo DPCT/Unicamp, gestora ambiental pela EACH/USP, e colabora com o Mobilize Brasil.
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