Qualquer pessoa que saia caminhando pela cidade de Salvador vai notar uma série de obras para a construção e renovação das calçadas na capital baiana. São obras realizadas diretamente pela gestão pública e também iniciativas dos moradores das principais vias da cidade. Mas, apesar dos avanços, não é mole ser pedestre pelas ruas e avenidas soteropolitanas.
A constatação foi feita pela equipe do Mobilize Brasil, que visitou Salvador em meados de dezembro, logo após a prefeitura da cidade ter divulgado informações sobre o programa "Eu curto meu passeio", que tem como meta a recuperação de 120 km de calçadas da capital baiana até o final de 2016.
Calçadão na Barra: exemplo de espaço público de qualidade
De fato, há calçadas renovadas em vários pontos da cidade, algumas com qualidade exemplar, como é o caso da região do Farol da Barra, transformada em um amplo calçadão por onde somente skates, patins, bicicletas, cadeiras de rodas e pedestres podem circular, 24 horas por dia. Seria uma calçada nota 10, segundo os critérios do levantamento Calçadas do Brasil.
Vimos intervenções no interior dos bairros, com pisos bem executados, com boa largura, e sempre dotados de faixas podotáteis, hoje quase uma mania em Salvador. Notamos, também, obras recentes ao longo da av Antonio Carlos Magalhães, na região entre o Terminal Rodoviário e o Parque da Cidade. Nesses pontos é possível atestar a má qualidade na execução das calçadas, como a falta de ajuste entre as peças podotáteis e a superfície de concreto, deixando frestas e imperfeições que logo se tornarão pequenos buracos, iniciando o processo de degradação da nova calçada. Enfim, o projeto é bem intencionado, os materiais são de boa qualidade, mas falta treinamento para os trabalhadores que colocam a mão na massa.
Nova calçada, com problemas na instalação do piso podotátil
No entanto, foi na região mais central da cidade, entre a av. Sete de Setembro e o Pelourinho, que encontramos os piores exemplos de calçadas. Decidimos visitar o Museu Solar do Unhão, conjunto arquitetônico histórico que passou por uma bela intervenção da arquiteta Lina Bo Bardi. Para caminhar do centro até a avenida do Contorno tentamos vários caminhos, mas todos apresentavam calçadas estreitas, repletas de buracos e degraus e, o que é pior, com carros estacionados sobre as calçadas. A saída foi seguir pela rua, com o olho atento no tráfego de veículos.
Quando saimos na avenida do Contorno não havia alternativa: as calçadas são muito estreitas e em alguns pontos simplesmente desaparecem, ao lado de muros de contenção. Pior: não há faixas de travessia ou semáforos que permitam ao pedestre cruzar a pista. E como o trânsito é intenso e veloz, o jeito é correr, saltar obstáculos e - com sorte - chegar à entrada do Museu.
No dia seguinte saimos da Barra, subimos a av. Sete de Setembro, chegamos ao centro e dali descemos até o porto. O começo da caminhada, na Sete de Setembro, foi tranquilo em função da densa arborização que protege e dá sombra a quem caminha. As calçadas e faixas de pedestres estão longe de serem exemplares, mas são composições de pedras portuguesas que merecem alguma conservação, além da inclusão de faixas e rampas de acessibilidade. O retorno, depois do Pelourinho foi mais difícil, especialmente quando chegamos à parte baixa da cidade, na região do porto de Salvador. Ali, salve-se quem puder: não há calçadas e quando existem estão destruídas, repletas de detritos ou interrompidas por buracos perigosos.
Calçada na região do porto de Salvador
Terminal Rodoviário
Outro ponto de difícil acesso é o Terminal Rodoviário de Salvador. Há uma generosa passarela, daquelas projetadas e produzidas sob a direção do arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé, a partir da fábrica de componentes pré-fabricados para urbanização de cidades. A fábrica ficava em Salvador e, desta forma, todas as grandes avenidas da cidade contam com essas passarelas cobertas, para a travessia dos pedestres. O problema é que o braço que chega à rodoviária está totalmente ocupado por dezenas de vendedores ambulantes, que vendem de tudo, de calçolas a vídeos pornô. Eles ocupam todo o espaço que deveria ser dos pedestres e fazem ali um barulho infernal. É assim que Salvador dá as boas vindas a quem chega.
Apesar de todos esses tropeços, a capital baiana é uma das cidades brasileiras mais agradáveis para se percorrer a pé. Caminhando, pode-se descobrir os segredos atrás de cada vitrine, olhar as fachadas dos edifícios históricos e modernos, conversar com os "soteros" ou parar em qualquer boteco para tomar uma cerveja e apreciar a paisagem estonteante da Baía de Todos os Santos. Ou ainda, descer pelo Elevador Lacerda ou pelos vários planos inclinados (funiculares) que ligam a Cidade Alta à Cidade Baixa. É uma viagem.
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