Este artigo, escrito por Julio Lamas, foi originalmente publicado na página Planeta Sustentável em novembro deste ano com o título “BRTs quadruplicaram nas cidades globais e RJ e BH têm os dois melhores sistemas do mundo, aponta estudo”.
Cerca de dez vezes mais baratos que os metrôs e entre três e seis vezes mais baratos que os Veículos Leves sobre Trilhos (VLT) por km construído, os sistemas de Bus Rapid Transit (BRT) se tornaram a solução econômica e sustentável favorita para o transporte público de alta capacidade em cidades com mais de 500 mil habitantes de países emergentes. Nos últimos dez anos, a implementação de sistemas BRT no mundo quase quadruplicou, crescendo 383% entre 2004 e 2014. Foram 1.850 km de um total de 2.580, de acordo com um estudo divulgado esta semana pelo Institute for Transportation and Development Policy (ITDP), endossado pela ONU-Habitat e a Climate Works Foundation.
Os centros urbanos do Brasil, China e México, respondem por 65% desse crescimento, aponta a pesquisa realizada em 62 cidades globais e 98 linhas. Mas países como França (68 km), África do Sul (70 km), Indonésia (210 km), Índia (95 km), Chile (25 km) e Argentina (3,5 km) também despontam entre os que apostaram no mesmo período no conceito de transporte público, criado na década 1970 em Curitiba, capital paranaense, pelo urbanista Jaime Lerner, então prefeito da cidade.
Os chineses lideram o ranking de expansão global de BRTs com 552 km construídos na última década, em cidades como Xangai e Guangzhou. O Brasil, principalmente no Rio de Janeiro e Belo Horizonte, teve 345 km implantados, seguido pelo México (234 km) e os EUA (104 km), onde cidades como Pittsburgh, Cleveland, Las Vegas e Los Angeles impulsionaram o aumento da malha. “Os norte-americanos têm a possibilidade de tomarem a segunda posição do Brasil nos próximos anos, se os corredores em planejamento de cidades como Boston, Chicago e San Francisco saírem do papel”, conta o engenheiro e urbanista mexicano Ulises Navarro, diretor de transportes para a América Latina do ITDP.
Segundo Navarro, o crescimento da infraestrutura de BRT da China poderia ter sido maior, tendo em vista a relação km construídos por quantidade de passageiros. “Houve um grande investimento em infraestruturas graças ao milagre econômico chinês, mas poderia ter sido mais. Eles enxergaram no Bus Rapid Transit uma oportunidade clara para resolver a mobilidade urbana em tempo relativamente mais curto. É possível implantar um sistema BRT, do planejamento à execução, em dois anos. Uma linha de metrô do mesmo tamanho, por sua vez, pode demorar de seis até dez anos”, esclarece.
De acordo com o estudo do ITDP, a Copa do Mundo e a proximidade da Olimpíada de 2016 no Rio de Janeiro foram responsáveis pelo ‘boom’ de crescimento dos BRTs no Brasil. Estão entre as pesquisadas pela entidade, a linha Cristiano Machado (6,7 km), de Belo Horizonte, e as cariocas Transoeste (54,7 km) e Transcarioca (39 km). “Também poderia ser mais, mas no Brasil há uma preocupação em incluir em cada projeto que não se tire espaço dos carros particulares nas vias, um problema que tem dificultado a evolução das faixas exclusivas de ônibus em BRTs na cidade de São Paulo. Isso traz um efeito negativo também em termos de custos, pois se constrói menos km por dólares investidos por conta de desapropriações e indenizações na ampliação de avenidas e ruas”, explica.
Mais do que a carga tributária e a corrupção nas esferas públicas, essa questão de planejamento para os BRTs no Brasil também se reflete no custo-benefício citado por Navarro. Para cada R$ 1 bilhão de dólares investidos em BRT nas cidades brasileiras se constrói 99 km de malha. Em comparação, pelo mesmo valor, se obtém 334 km na China e 152 km no México.
Todavia, a linha mineira Cristiano Machado e a Transcarioca são apontadas como os melhores sistemas do mundo hoje, os únicos que atingiram o padrão “gold” do ITDP em 2014. Avaliadas em mais de 30 critérios, como extensão, planejamento, design das estações, comunicação com os usuários, além de integração com outros modais e acesso, essas malhas atingiram pontuações acima de 85 pontos possíveis de uma escala de 0 a 100.
“São linhas novas, que, por conta do pouco tempo de uso, ainda possuem um ótimo padrão de atendimento. Mas ainda precisam melhorar em termos de barreiras físicas das vias, informações aos usuários, treinamento de parada dos motoristas nas estações para facilitar o acesso, além de integração para quem usa bicicleta”, afirma o diretor do ITDP. “Com o tempo de uso é normal que apareçam problemas de superlotação, manutenção ou problemas financeiros nos BRTs, o que faz com que alguns percam pontos no estudo de qualidade. Esse foi o caso do TransMilênio, em Bogotá, do Metrobus, no México, e da Transoeste do Rio, que já possui dois anos de uso, foi ‘gold’ e, hoje, caiu para ‘silver’, explica Navarro.
O que é um BRT?
O conceito é simples e opera como um metrô sobre rodas. Implantado pela primeira vez em Curitiba sob a alcunha de “Ligeirinho”, o BRT funciona com faixas exclusivas e expressas para ônibus – normalmente duplas ou triplas -, que são separadas fisicamente nas vias por barreiras. Em alguns sistemas, os passageiros pagam antes de entrar e o embarque é feito na altura da plataforma para agilizar o acesso, exatamente como um metrô ou trem.
Nos últimos quarenta anos, o aperfeiçoamento de tecnologia trouxe grande ganho operacional e redução de custos se comparado às linhas férreas e subterrâneas. A capacidade de transporte em uma mesma extensão de faixa é dez vezes maior que a de um carro, com a vantagem de não parar no trânsito.
Cidades revolucionadas pela mobilidade urbana possuem alguns dos sistemas mais famosos do planeta, caso do TransMilênio de Bogotá, na Colômbia. Projetado no começo dos anos 2000, o TransMilênio (foto acima) transporta 1,8 milhão de passageiros diariamente. E o Metrobús da Cidade do México é um dos mais movimentados, chegando a levar 75 mil passageiros por hora.
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