Relocar linhas de metrô, otimizar itinerários de ônibus, criar faixas exclusivas para o transporte público nas grandes avenidas, aumentar o número de ciclovias e de passeios para o pedestre; além de reduzir o número de giros à esquerda, sinais de dois tempos e até de binários. O arquiteto e urbanista César Barros propõe uma verdadeira mudança no sistema viário do Recife. As propostas, muitas passíveis de polêmica, já que vão de encontro ao modelo que vem sendo adotado pelos gestores públicos, para César Barros, são essenciais para resolver os entraves da mobilidade na cidade.
"Vivemos em uma das cidades mais belas do mundo, beneficiada com uma geografia simples em relação à mobilidade, mas as obras sempre foram pensadas numa visão rodoviária e numérica, associando o tempo, demanda e velocidade com qualidade de transporte. O humanístico sempre foi deixado em segundo plano. Não precisamos de novas obras viárias; já temos viadutos e túneis em excesso, inclusive muitos desnecessários. A solução está em reorganizar o nosso sistema de transporte”, afirma Barros, acrescentando que todos os modais deveriam conviver no mesmo plano que o pedestre, seja carro, VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), BRT (Bus rapid transit) ou bicicletas. “Todos devem se respeitar; chega de elevados, estações, terminais e passarelas”.
Na opinião de César Barros, que já foi presidente da Empresa de Urbanização do Recife de 2002 a 2006, as duas linhas de metrô (Centro e Sul) que cortam o Recife e transportam diariamente cerca de 400 mil passageiros foram “construídas nos lugares errados”. “Por pragmatismo dos gestores públicos, que quiseram aproveitar uma linha férrea já existente, o Recife tem hoje um transporte de metrô que compete com o corredor de ônibus; os modais não se complementam”, afirma. Segundo ele, os trilhos deveriam ser relocados para a as avenidas Agamenon Magalhães (ligando Jaboatão dos Guararapes a Igarassu – Sul e Norte da RMR) e Caxangá (ligando o Marco Zero a São Lourenço –Leste e Oeste da RMR). “No mundo inteiro, as linhas de metrô ou VLT são construídas nos eixos longitudinal e transversal da cidade (Norte/Sul e Leste/Oeste). Aqui, seria na Agamenon e na Caxangá”, afirmou.
De acordo com a proposta, os trilhos e vagões seriam reaproveitados e adaptados para funcionar como VLT em vez do metrô, transitando no mesmo plano dos outros modais. Na Avenida Agamenon Magalhães, o corredor do VLT seria implantado ao lado da calçada. A proposta também defende a redução da largura das faixas destinadas aos automóveis para abrir espaço para as bicicletas e o transporte público.
Proposta para a Avenida Conde da Boa Vsta Questionado se os VLTs conseguiriam absorver a demanda do metrô, já que possuem uma menor capacidade, Barros garante que sim. "Acredito até que mais pessoas passariam a utilizar o veículo sobre trilhos. Além disso, ao contrário do metrô, cujos muros segregam a cidade, o VLT possui uma velocidade menor e pode conviver com outros modais, respeitando a sinalização”.
O arquiteto defende que a qualidade de transporte não pode ser avaliada em tempo e, sim, em conforto e previsibilidade. “Se o cidadão caminha em uma calçada acessível e arborizada, tem a certeza de que seu ônibus vai chegar no horário previsto e sabe o tempo gasto na viagem, ele não estará preocupado com velocidade. Por que eu prefiro pedalar do Centro do Recife até Jaboatão do que ir de ônibus? Porque sei que o tempo gasto de bicicleta será de uma hora. Isso é previsibilidade. Já de ônibus, a viagem pode durar 40 minutos, uma hora ou até duas horas”, argumenta Barros.
Já os ônibus e BRTs que hoje circulam na Caxangá e Conde da Boa Vista seriam relocados para as vias radiais e perimetrais [confira no gráfico abaixo]. “O trânsito nas avenidas Conde da Boa Vista e Caxangá é uma loucura, são mais de 80 linhas diferentes em uma mesma via. Os ônibus acabam disputando espaços com os BRTs, fazendo ultrapassagens proibidas”.
Para complementar o transporte, seriam ofertados micro-ônibus nas regiões cortadas pelas radiais e perimetrais. “Os pedestres andariam no máximo 200 metros para pegar o ônibus. Seria um transporte complementar para alimentar o sistema”.
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