Deixar o carro em casa e fazer os deslocamentos cotidianos de outras formas – caminhando, andando em coletivos ou de bicicleta – é, essencialmente, uma questão de mudança de comportamento. Estudos apresentados pela psicóloga Adriana Jakovcevic, pesquisadora da Universidade Aberta Interamericana da Argentina nas áreas de energias renováveis, transporte sustentável e comportamento, indicam que, apesar da necessidade de infraestrutura e de alternativas eficientes e confortáveis, a decisão pelo modal que será adotado é uma questão de hábito. Ela foi uma das palestrantes do II Seminário Internacional de Mobilidade e Transportes, realizado em Brasília (DF).
Em Buenos Aires, por exemplo, nos últimos quatro anos foram construídos 130 km de ciclovias. Apesar do incremento, o número de viagens feitas com bicicletas ainda é pequeno, embora tenha crescido: passou de 0,4% para 3%. E, entre os ciclistas, apenas 5% trocaram o carro pela pedalada. “Isso indica que somente a infraestrutura não basta. É necessário uma mudança cultural que pode ser feita com um conjunto de medidas”, explica a pesquisadora.
O que pode funcionar?
De acordo com Adriana Jakovcevic, há três variáveis psicológicas que determinam o uso do transporte pelos cidadãos: a atitude, o controle comportamental e a intenção. Assim, é preciso, primeiro, estimular uma atitude positiva. “Tem-se que valorizar os aspectos positivos dos meios de transporte. Isso cria uma norma subjetiva, ou seja, consolida o que pensamos sobre esse meio de transporte”. Isso passa, também, por municiar os usuários com informações acessíveis sobre o transporte público, rotas possíveis de serem percorridas de bicicletas ou a pé.
Depois, será possível implementar uma mudança comportamental e transformar as escolhas em hábitos. “Quando o hábito de uso de outro meio de transporte fica mais forte, começamos a elegê-lo sem pensar”, afirma. Mas a pesquisadora alerta que essas mudanças não ocorrem do nada: elas dependem da motivação de cada pessoa, ou seja, da intenção. Por isso, as ações devem considerar o estado motivacional do público. “É preciso dar informação, fixar objetivos, criar incentivos. São medidas aplicáveis em pequenas organizações, universidades, comunidades”, explica. Mais de cem estudos, conforme a psicóloga, analisaram intervenções assim em diversos locais e constataram que elas incrementaram o uso de transporte alternativo ao individual entre 39% e 46%.
Medidas destacadas por especialistas e já adotadas em algumas cidades no mundo, como pedágios urbanos, estacionamentos pagos e menores, na avaliação dela, até podem ajudar na promoção de novos hábitos, mas isso ocorre temporariamente. Além disso, medidas assim são impopulares e afetam quem não pode pagar pelo uso do carro. Por isso, na avaliação de Adriana, medidas mais suaves, que impactem na percepção dos indivíduos, nas suas crenças e nos seus valores tendem a ser mais efetivas.
O II Seminário Internacional Mobilidade e Transportes ocorreu entre os dias 20 e 23 de outubro, na Câmara dos Deputados. O evento, que teve como tema “Mobilidade para Cidades Sustentáveis”, contou com o apoio da CNT (Confederação Nacional do Transporte), do Sest Senat e do ITL (Instituto de Transporte e Logística).
Leia também:
Enfim, chegamos às calçadas
Prefeitura de SP anuncia licitação para reforma de calçadas
Em SP, escola dá lições de mobilidade sustentável