Em três projetos de novos bairros, situados em zonas de expansão de metrópoles brasileiras - no Distrito Federal e em Minas Gerais -, arquitetos do país e estrangeiros têm como premissa a criação de urbanidade ambientalmente agradável e a relação amistosa entre veículos e pedestres na área envoltória de edificações residenciais ou de uso misto.
O espanhol Fermín Vázquez, do estúdio b720, e o ateliê brasiliense Domo Arquitetos, de Daniel Mangabeira, Matheus Seco e Henrique Coutinho, atuam em zonas ao sul e ao oeste do Plano Piloto de Brasília; já o escritório De Fournier dá as regras para empreendimento a ser implantado ao norte de Uberlândia.
Abrir-se para o entorno é outra característica compartilhada pelos trabalhos, que pretendem pôr fim à cultura da segregação física dos condomínios fechados.
Conforto ambiental
Uma cidade sustentável - essa é a abordagem de Fermín Vázquez para área de 3,4 milhões de metros quadrados na região de Vicente Pires, a oeste do Plano Piloto de Brasília, junto de uma das principais vias de acesso ao núcleo histórico da capital federal.
“Rever os valores funcionais da cidade de Brasília, adaptada à nova conjuntura social, econômica e ambiental”, é a justificativa do arquiteto para a criação do projeto Nova Área Urbana (NAU), que conta com oito morfologias urbanas entremeadas a possibilidades ambientais e viárias (coexistência ou isolamento de ruas de pedestres e de veículos, padrões distintos de áreas verdes etc.), assim como tecnologias de gestão urbana automatizada, para configurar distritos autossustentáveis.
Entre as soluções tecnológicas previstas pelo projeto, aliadas a boas práticas de ventilação cruzada e minoração das ilhas de calor, figuram a possível integração de sistemas de fachada verde e de elementos de captação solar, a coleta e depuração de águas residuais e a recolha pneumática de resíduos sólidos, a climatização integrada de cada distrito e a utilização de rede alternativa de água reciclada. Os distritos estão organizados segundo um eixo longitudinal de densidade máxima oposto a zonas de menor ocupação.
Contra o muro, a permeabilidade urbana
O projeto do bairro de uso misto a ser implantado no Setor Habitacional Jardim Botânico, de Brasília, está em análise pela Secretaria de Habitação da cidade. Situado em terreno com vocação residencial por causa da sua localização, teve a primeira fase - de plano básico, com a definição do desenho urbano e da distribuição das áreas de ocupação - desenvolvida por empresa local de consultoria ambiental e urbana. Mas as diretrizes arquitetônicas de cada conjunto de edifícios e o ajuste fino da urbanização são de autoria do escritório Domo. “Termos iniciado nossa participação antes de as regras de urbanismo estarem aprovadas nos deu a oportunidade de fazer pequenos ajustes, que beneficiaram o projeto arquitetônico”, comentam os autores no memorial do projeto. A previsão do início das obras é entre 2015 e 2016.
Uma das condicionantes do projeto foi neutralizar a potencial barreira física representada por via de alto tráfego lindeira ao terreno e que dá acesso, a 25 quilômetros, à ponte JK, junto ao lago Sul. Também foram considerados outros aspectos, como tirar partido da vizinhança de uma área de proteção ambiental (APA).
A borda externa do complexo foi pensada como uma faixa de uso misto que, servida por malha de praças comuns a todo o conjunto, setoriza a zona estritamente residencial em relação à via principal de ligação com a cidade estabelecida. “São sete praças interligadas por galerias cobertas que conectam os edifícios”, salientam os autores. Também no miolo do lote, praças intercaladas a edificações conferem intimismo e conforto ambiental. Desníveis de cerca de três metros acomodam os edifícios ao relevo, de modo que as ruas configuram malha contínua de acesso às construções.
Também no setor exclusivamente residencial, na parte mais baixa do lote, a topografia foi abordada de modo a qualificar os espaços públicos e as visuais para a APA. Os autores incorporaram à demanda do cliente por apartamentos ou casas geminadas de até quatro pavimentos um térreo semienterrado que faz as vezes de garagem. Mais uma vez, os muros saíram de circulação.
Humanização do espaço privado
O projeto do escritório De Fournier Associados é para um centro de bairro de região localizada no eixo de expansão norte da mineira Uberlândia, próximo do aeroporto e da rodovia BR-50. Trata-se de um empreendimento privado aberto, sem muros, planejado para o uso misto. No total, estão previstas 1,5 mil unidades habitacionais em 750 mil metros quadrados de área, cuja implantação deverá ocorrer entre 2014 e 2017. Sintomático de sua vocação central, o programa prevê o atendimento de 8 mil visitantes flutuantes, contra 5,6 mil residentes.
A mistura de usos deverá garantir a vitalidade e a humanização do complexo, em convívio da circulação de pedestres com o transporte privado e público (uma estação de BRT faz parte do programa), assim como com ciclovias. Tanto geográfica quanto arquitetonicamente, o uso misto é prerrogativa do projeto, com a valorização, por exemplo, de térreos comerciais voltados para a rua.
Vista aérea do NAU, em Brasília, com o eixo longitudinal (bulevar)
Dados dos três projetos:
Nova Área Urbana (NAU), em Brasília, DF
Início do projeto: 2012
Área do terreno: 3.440.000 m2
Arquitetura: b720 Fermín Vázquez Arquitetos
Bairro em Brasília, DF
Início do projeto: 2012
Áreas: 60.256 m2 (edifícios); 9.420 m2 (quadras de esportes, piscinas e estacionamento)
Arquitetura: Domo Arquitetos
Granja Marileusa, em Uberlândia, MG
Início do projeto: 2012
Área do terreno: 750.000 m2
Arquitetura, urbanismo e planejamento: De Fournier & Associados