Alan Martins é manobrista, mora em Jacarepaguá, na zona oeste da cidade, e trabalha no centro. Ele pega dois tipos de transporte - primeiro, um ônibus, e depois, um trem, e ainda leva 2h20 para chegar ao trabalho. “É terrível e até uma falta de respeito porque a gente paga um preço alto pela passagem. O trem é lotado, mas tem ar-condicionado. O ônibus não tem, é no calorão mesmo”, disse.
Sebastião Vilar dos Reis é técnico de informática e todos os dias vai de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, para o centro. Ele contou que, onde mora, somente uma linha de ônibus tem ar-condicionado e nem sempre pode esperar por ela. O jeito é pegar um ônibus sem refrigeração. Os passageiros abrem as janelas e a ventilação do teto. “Nos ônibus que não têm ar-condicionado, quem está na cadeira do canto tem que vir pendurado nas janelas para ver se pega um vento. Agora, o pessoal que está em pé sofre mais”, acrescentou.
O sofrimento com o calor é ainda maior para motoristas e cobradores. Muitos profissionais passam mal e há motorista que vai parar em uma Unidade de Pronto-Atendimento (UPA), disse o motorista Marciano Costa. "Se aqui fora faz 50º [Celsius], lá dentro do carro, ao lado do motor, faz 60º. A maioria das vezes, eu trabalho no quentão, já estou até acostumando, tem que trabalhar. É toalhinha para secar o rosto, garrafinha de água do lado para beber toda hora", explicou.
A cobradora Joelma dos Santos precisou, várias vezes, interromper o trabalho por causa de queda de pressão. "Quando eu trabalhava à tarde, rendia o carro porque a pressão caía. Graças a Deus, tenho trabalhado em carro de ar. Hoje, trabalhei em um quente e não estou legal. Sofri um pouco. Estou meio tonta, não estou normal", disse ela.
Na avaliação do professor do Centro de Tecnologia e Ciência, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Alexandre Rojas, especialista em transportes, o calor é ruim tanto para o passageiro quanto para o motorista, que fica em contato com o calor por até nove horas de trabalho. "O motorista, com o calor, dirige mal, fica irritado e mais suscetível a um acidente diante de uma situação de desconforto", alertou em entrevista à Agência Brasil.
Para o professor, o empresário do setor de transportes precisa mudar o conceito que tem do usuário. "Na hora em que o dono da empresa deixar de enxergar o usuário como passageiro e considerá-lo cliente, importante para a sua sobrevivência, tem que passar a oferecer uma qualidade de serviço melhor", disse.
Na capital, segundo a Rio Ônibus, representante das 43 empresas que operam na cidade, a frota tem 8.700 veículos e somente 18,7% têm ar-condicionado. No estado, de acordo com a Federação das Empresas de Transporte de Passageiros (Fetranspor), são 20 mil ônibus e, desse total, apenas 3.600 veículos têm o equipamento.
A Secretaria Municipal de Transportes do Rio informou à Agência Brasil que o plano estratégico da prefeitura é chegar a 2016 com 100% da frota de ônibus urbanos equipada com ar-condicionado. A secretaria acrescentou que em 2013, por causa do desequilíbrio tarifário, não houve avanço nesses números. Para a prefeitura, o plano está mantido, mas vai precisar de investimento e, consequentemente, terá impacto tarifário.
A Rio Ônibus informou que no contrato de concessão assinado em 2010 com os consórcios Intersul, Internorte, Transcarioca e Santa Cruz não estava prevista a substituição da frota de ônibus urbanos por veículos equipados com ar-condicionado. “ Depende de determinação da prefeitura do Rio, que estabelecerá os critérios técnicos e a forma de custeio”, disse à Agência Brasil.
No ano passado, a prefeitura chegou a anunciar um aumento de tarifa que passaria de R$ 2,75 para R$ 2,95, mas recuou depois das manifestações populares em junho. Para a Rio Ônibus, o recuo no valor da tarifa, que permanece a mesma desde janeiro de 2012, reduziu a capacidade de investimento dos consórcios e a mudança dos veículos exige o reequilíbrio econômico-financeiro do acordo feito com a prefeitura.
Segundo a Fetranspor, um ônibus urbano convencional custa cerca de R$ 350 mil e esse valor aumenta R$ 50 mil se tiver ar-condicionado. Os gastos, de acordo com a federação, incluem a contratação de mão de obra especializada para a manutenção e a compra regular de insumos relacionados ao equipamento. Em empresas com grandes frotas, esse custo representa cerca de 0,5% do custo mensal de manutenção de cada ônibus. “Além da manutenção, há os gastos com o consumo de combustível, que aumenta de 15% a 20% no alto verão”, acrescentou a federação.
Edição: Graça Adjuto
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