Segundo o Observatório das Metrópoles, instituto de pesquisa “virtual” coordenado pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, dos 24,2 milhões de carros que engrossaram a frota nesse período, 14,6% começaram a circular no ano passado.
As 15 principais regiões metropolitanas do país ganharam, em média, 1 milhão de automóveis por ano e terminaram 2012 com 24 milhões de veículos, resultando em quilométricos congestionamentos que dificultam a vida da população.
O nó da mobilidade é resultado de políticas públicas que privilegiam o transporte individual, aliado ao crescimento desenfreado das cidades.
O problema é ainda mais sério na região metropolitana de São Paulo, onde o número de automóveis cresceu 76% entre 2001 e 2012, totalizando 8,6 milhões. Melhorar a qualidade do transporte público é uma das promessas de campanha do prefeito Fernando Haddad (PT).
Na sexta-feira, a presidente Dilma Rousseff disse em São Paulo que seu governo está investindo R$ 140 bilhões em obras de mobilidade urbana em todo o país.
Do pacote de R$ 5,4 bilhões para obras previstas para o Estado, R$ 4 bilhões vêm de financiamentos e R$ 1,34 bilhão do Orçamento Geral da União, a fundo perdido.
A grande bandeira de Haddad na prefeitura é implantar 150 km de corredores de ônibus até 2016 – hoje existem 119,3 km. Além disso, a cidade tem agora 358,6 km de faixas exclusivas, 236,5 km criadas na atual gestão – já foi superada a meta de 220 km até o final do ano.
Pesquisa da prefeitura mostra que a velocidade média dos ônibus passou de 14,3 km/h para 20,8 km/h. “As obras refletem nossa principal diretriz, de focar no transporte público em uma busca de qualidade”, diz Jilmar Tatto, secretário municipal de Transportes.
Apenas com a licitação de 127 km de corredores, estão previstos investimentos de R$ 4,4 bilhões, parte financiados pelo Programa de Aceleração do Crescimento.
O governo do Estado, por sua vez, quer inaugurar 24 estações do Metrô até o fim de 2014, fazendo os atuais 74,3 km de malha passarem para 100 km. Também vai modernizar as linhas 9, Esmeralda, e 11, Coral, da Companhia de Trens Metropolitanos.
Já a Prefeitura de Salvador prevê investimentos de R$ 1,1 bilhão em mobilidade até 2016 – R$ 600 milhões do governo federal, metade a fundo perdido.
“O transporte público de ônibus é nossa prioridade porque o atual modelo está ultrapassado e passa por uma reestruturação”, diz Albérico Mascarenhas, chefe da Casa Civil.
O edital de concessão das novas linhas está prestes a ser divulgado e o governo espera implantar o projeto até julho de 2014.
Estão previstas ainda a construção do corredor Lapa-Pituba, que vai receber um sistema de veículo sobre trilhos, o chamado VLT, e da Linha Viva, uma via expressa pedagiada de quase 18 quilômetros, que vai do Acesso Norte, na BR-324, à estrada do Aeroporto. Mas parte da população e alguns vereadores estão contra o projeto. Houve tumulto nas quatro audiências públicas realizadas.
“Há uma onda de investimentos em corredores de veículos articulados que trafegam em faixas exclusivas, os chamados BRTs. São medidas importantes para melhorar a fluidez, mas não resolvem o problema”, explica Juciano Martins Rodrigues, pesquisador do Observatório das Metrópoles. “Apesar do discurso de privilegiar o transporte de massa, grande parte dos investimentos é direcionada ao transporte individual. Ao lado do corredor de BRT, são instaladas várias faixas para o tráfego de automóveis”, acrescenta.
Para os especialistas, melhor encaminhamento do problema passa por investimentos nos transportes sobre trilhos, na restrição à circulação de carros em determinadas áreas da cidade, e na construção de ciclovias seguras e sistemas de integração.
Praticamente todos os prefeitos anunciam planos de ciclovias. Enquanto isso não acontece, um sistema de aluguel de bikes para pequenos percursos desembarcou no Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre, Salvador e Recife.
A iniciativa é resultado de uma parceria entre prefeituras e a Samba/Serttel, responsável pelo desenvolvimento da tecnologia e operação dos serviços.
“Quando iniciamos, ninguém acreditava na ideia,” conta Ângelo Leite, presidente da Sertell, que bancou o projeto por dois anos, até fechar um patrocínio com o Itaú Unibanco, em 2011.
“A mobilidade é uma das plataformas de sustentabilidade do banco”, explica Cícero Araújo, diretor de relações institucionais e governo. O programa foi cercado de cuidados.
“Pedimos a ajuda da Companhia de Engenharia do Tráfego (CET) e de cicloturistas para criar e divulgar uma espécie de roteiro com dicas para conviver melhor no trânsito”, diz Luciana Nicola, superintendente de relações institucionais e governo.
O usuário paga R$ 10 na inscrição ao programa e pode usar as bicicletas por um mês, por períodos que variam entre 30 minutos e 60 minutos, dependendo da cidade, sem pagar nada. Vai desembolsar R$ 5 se ultrapassar o tempo.
Ao que tudo indica, o sistema foi aprovado. Só no Rio de Janeiro, foram realizadas 2,4 milhões de viagens desde 2011.
A mobilidade é um dos muitos problemas que envolvem a infraestrutura urbana. “Há um enorme descompasso entre o desenvolvimento econômico e a qualidade de vida da população”, comenta Carlos Leite, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie. “Falta infraestrutura para prestar os serviços públicos, e eles são escassos e de má qualidade”, explica Sérgio Magalhães, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB).
Na raiz do problema, está a falta de um planejamento integrado para nortear o crescimento das metrópoles, agravada pela atuação de grupos econômicos que lutam para adaptar as políticas públicas a seus interesses. Neste contexto, cidades como São Paulo, Rio e Salvador passaram por grandes transformações nos últimos 40 anos. Os bairros mais nobres se verticalizaram, as áreas centrais passaram por processos de deterioração e a população mais pobre foi empurrada para áreas cada vez mais distantes. Levar infraestrutura para a periferia passou a ser um grande desafio para os governantes, principalmente em função do altos custos.
Leite e Magalhães defendem o adensamento das cidades, para aproveitar a infraestrutura existente e, em muitos casos, ociosa, como acontece nas regiões centrais. Para Leite, o melhor exemplo é o projeto de recuperação do Porto Maravilha, uma das regiões mais degradadas da área central do Rio de Janeiro. Ele prevê a revitalização em 15 anos, por meio de uma parceria público privada. No local, será instalada uma infraestrutura completa de transportes e comunicação, que irá servir aos edifícios comerciais e à população que vai residir na área.
Outro projeto considerado inovador é o Arco do Futuro, da Prefeitura de São Paulo. Uma das ações vai conceder incentivos fiscais por 20 anos para empresas de serviços intensivos de mão de obra dispostas a se instalar na zona leste, onde mora 35% da população, mas que oferece apenas 16% dos empregos da capital.
“Planejar a cidade é fundamental para aproveitar os recursos públicos disponíveis e, se necessário, comandar a expansão sem cometer os erros do passado”, diz Ana Fernandes, professora do programa de pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Enquanto as novas propostas estão no forno, os municípios se desdobram para universalizar serviços. É o caso de Guarulhos, na região metropolitana de São Paulo, com população estimada em 1,3 milhão de habitantes.
Partindo do zero, em 2008, o município agora trata 35% do esgoto coletado, beneficiando 455 mil habitantes. “A expectativa é chegar a 80% até 2017″, diz Afrânio de Paula Sobrinho, superintendente do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE). Até agora, os investimentos somam R$ 409 milhões, 15% de recursos próprios e o restante por meio do PAC.
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