Especialista aponta sete soluções para a mobilidade urbana

Enrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá, dá dicas para o futuro com foco nas pessoas e não nos automóveis

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Fonte: Diário Catarinense  |  Autor: Emanuelle Gomes  |  Postado em: 09 de outubro de 2013

Peñalosa pedalou na SC-401 em Florianópolis

Peñalosa pedalou na SC-401 em Florianópolis

créditos: Alvarélio Kurossu / Agencia RBS

 

Para transformar as cidades será preciso uma mudança de paradigmas. O futuro, segundo o ex-prefeito de Bogotá Enrique Peñalosa — um dos papas da mobilidade no mundo — inclui restringir o uso dos carros, aumentar o preço dos combustíveis, implantar pedágios urbanos e acabar com os estacionamentos. Além disso, será preciso humanizar as cidades com o fim das rodovias e inclusão de avenidas e mudar o conceito do que é uma rua: mais espaços para ônibus, ciclovias e calçadas.

 

Longas pausas separam os pensamentos do estudioso sobre mobilidade urbana que palestrou na noite de segunda-feira no Fronteiras do Pensamento. No trajeto entre a avenida Mauro Ramos e a SC-401, Peñalosa falou sobre as experiências positivas em mobilidade acumuladas de 1998 a 2001, quando administrou Bogotá. 

 

Mas é natural vê-lo virar a cabeça para os lados e interromper o discurso para observar atentamente os erros e acertos na vida de Florianópolis — e comum a muitas cidades catarinenses. Nos primeiros metros ele logo aproveita as situações para dar exemplos de mudanças inevitáveis.

 

Graduado em Economia e História e pós-graduado em Administração Pública, Peñalosa fez em quatro anos em Bogotá o que a população de Florianópolis espera ansiosa: remodelou calçadas, implantou 350 quilômetros de ciclovias protegidas e revolucionou o modelo de transporte público buscando referência em Curitiba. Mesmo assim, faz questão de dizer que Bogotá não é nenhum exemplo. Para ele, sua administração conseguiu fazer algumas coisas que funcionaram bem e que, com o tempo, mudaram a vida da população.

 

Mas não foi fácil. Peñalosa diz que quase teve o mandato cassado por proibir o estacionamento de carros em cima das calçadas. Justamente o que ele faz questão de apontar na avenida Mauro Ramos, área central de Florianópolis. 

 

Para o colombiano, mais importante do que qualquer outro assunto, talvez até mais do que a questão das ciclovias, são as calçadas. Ele faz questão de lembrar que calçadas com qualidade são sinônimos de cidades desenvolvidas e se assustou ao ter contato com a realidade local de infraestrutura do pedestre. 

 

Ao percorrer a SC-401, uma das rodovias com maior fluxo de veículos de Santa Catarina por ser a ligação entre o Centro de Florianópolis e os badalados balneários no Norte da Ilha, para o carro, desce e tira uma foto de uma bicicleta fantasma que marca a morte de um ciclista. Comenta sobre a rodovia:

 

"Isso é um desrespeito à dignidade humana", disse Peñalosa.

 

Para ele, estradas como a SC-401 deveriam ser transformadas em avenidas, com comércio e casas ao redor, humanizando o espaço. Mesmo assim, ele coloca o capacete, sobe na bicicleta e pedala alguns metros. Diz que o trecho completo, até Canasvieiras, é para "aventureiros loucos" e faz uma breve citação sobre dois curtos trechos de ciclofaixas que encontrou entre o Terminal de Integração de Canasvieiras (Tican) e o trevo de acesso ao bairro. "É melhor que nada", finaliza.

 

 

Confira os pontos analisados por Peñalosa e a experiência de Bogotá

1 — Ciclovia

Há 15 anos construímos em Bogotá mais de 350 km de ciclovia protegidas. Fizemos também 70 km de rodovias só para bicicletas. Tudo isso em três anos. Fazer essa extensão de ciclovias não é um problema econômico. É um problema político. Gastamos muito para fazer, não lembro quanto foi, mas pode se fazer quase que gratuitamente, simplesmente colocando obstáculos físicos. Podemos eliminar estacionamentos e fazer ciclovias protegidas. É importante que sejam largas e nas vias principais.


2 — Transporte público

Em Bogotá fizemos um transporte coletivo nos moldes do sistema de Curitiba, com faixas exclusivas para ônibus e estações que mobilizam mais passageiros hora/sentido que 95% dos metrôs do mundo. O nome é Transmilênio. Colocamos assim para ser um pouco mais sexy, porque há a imagem de que para usar ônibus tem de ser pobre. Nunca entendi, mas transporte está diretamente relacionado a status social. Eu prefiro os ônibus. O ideal, no futuro, para o mundo inteiro, é se cobrar mais pelo uso do carro, em combustíveis, em pedágios ou estacionamentos. Com esses recursos pode-se dar um transporte público melhor e mais barato à população.


3 — Calçadas

Aqui (avenida Mauro Ramos) as calçadas são ridículas. Em todas as cidades do mundo é assim. Veja os carros em cima das calçadas. Se tivermos calçadas muito mais amplas, ciclovias protegidas, as cidades serão muito mais humanas. O que difere hoje as cidades avançadas das atrasadas não são as rodovias é a qualidade das calçadas.


4 — Crescimento da cidade

A cidade não pode crescer desordenadamente. Temos que tratar os lugares que têm mais densidade com a construção de parques, com melhores espaços públicos. Podemos fazer projetos completamente distintos para os locais em que Florianópolis vai crescer. E, finalmente, é importante ter claro que o metro quadrado em Florianópolis vai facilmente triplicar nos próximos 50 anos. Será três vezes mais do que é construído hoje. Temos que ter claro onde queremos que seja construído nesses metros quadrados adicionais.


5 — Restrição a automóveis

Na minha opinião, o que foi feito nos últimos 90 anos é um desastre. Foi feito muito mais para a mobilidade dos carros do que para os humanos. E, mesmo assim, não funciona para a mobilidade dos carros. Para solucionar a mobilidade urbana de Florianópolis, vejo que não há nenhuma outra solução a não ser ônibus com faixas exclusivas. Isso não solucionará os engarrafamentos. Eles só se resolvem restringindo o uso do automóvel. Como? Com uso do carro apenas em certas áreas da cidade, cobrando pedágios, com o rodízio, por exemplo.


6 — Parques à beira-mar

O ideal era que à beira do mar não circulassem carros. Seria melhor enterrar as avenidas e colocar um parque em cima. No futuro, certamente, isso vai acontecer. Madri nos últimos anos enterrou sete quilômetros de rodovias junto a um pequeno rio para fazer um parque. E não é um mar maravilhoso como esse, é um rio. Vejo que os espaços em frente ao mar, para pedestres ou ciclovias, as pessoas aproveitam e usam muito. Os outdoors deveriam ser retirados, como ocorreu em São Paulo.


7 — Rodovias transformadas em avenidas

Em Florianópolis há alguns problemas com as rodovias que atravessam a cidade. São como rios venenosos. É muito melhor ter avenidas. Qual é a diferença? Avenidas têm semáforo, tem edificações aos lados, comércio.


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