Gradualmente esquecidas, muitas das áreas públicas das cidades deixaram de ser espaços de convivência para se tornar locais de passagem – na volta do trabalho ou da faculdade, no caminho para o supermercado ou para o ponto de ônibus –, em uma notável distorção de funções.
As cidades, para serem locais agradáveis onde se viver, precisam ser pensadas não em blocos isolados, mas como um sistema formado por peças interdependentes – relacionadas entre si e com o todo ao redor – e como espaço de interação e convívio. O uso e apropriação dos espaços públicos pelas pessoas é parte do processo de humanização das cidades, em um esforço para melhorar a qualidade da convivência nas ruas.
O uso dos espaços públicos, em essência, pressupõe muito mais do que apenas circular de um lugar a outro: trata-se, antes, dos encontros que podem proporcionar, das diferentes relações que podem surgir a partir daí, dos momentos de lazer e descanso, da convivência entre pessoas.
Abaixo estão listados alguns exemplos de espaços e iniciativas que mostram uma outra cidade possível, planejada para as pessoas, a partir de um modelo de desenvolvimento com a participação de governos e sociedade em conjunto.
Parque de Madureira, Rio de Janeiro
O Parque de Madureira, na Zona Norte do Rio, é uma área verde linear, construída paralelamente à linha férrea, que recebe em torno de 60 mil pessoas por semana. São 103 mil metros quadrados (equivalente à área de 12 campos de futebol) divididos entre quadras esportivas, praças de alimentação, pistas para caminhada, mirante, gramados. O Parque tem três estações do BikeRio, para quem é adepto das magrelas, e é exemplo de sustentabilidade: utiliza a água da chuva para irrigação e toda a iluminação é de lâmpadas LED, que consomem metade da energia de um modelo comum. Foram 100 milhões de reais para transformar o antigo terreno baldio da empresa Light no Parque conhecido hoje – uma prova de que o investimento em espaços públicos muda, para melhor, o entorno e a vida da comunidade em que forem inseridos.
(Foto: Fernando Frazão)
High Line, Nova York
O High Line foi construído ao longo de uma ferrovia da década de 1930 e que fora desativada nos anos 1980. O espaço, de 2,6 km de extensão, foi revitalizado em uma parceria entre poder público, mobilização civil e engajamento comunitário. Inicialmente abandonada, a área havia se tornado um local crítico da cidade. Diante da proposta de demolição, um grupo fundou a Friends of the High Line, organização que lutou pela transformação da rodovia em um espaço público de convivência. O resultado é o famoso parque suspenso conhecido hoje que atrai milhões de turistas todos os anos e é um dos maiores exemplos de revitalização urbana do mundo. Outra coisa bacana a respeito do High Line é que quase tudo é custeado pela a associação. As atividades são planejadas, voluntários são reunidos todos os anos, reduzindo os custos, e várias empresas grandes, como Toyota, apoiam o projeto.
(Foto: Anual Design)
Ponto de ônibus em Campinas, São Paulo
A imagem fala por si: um ponto de ônibus equipado com pia, filtro, copos de plástico e lixeira. A iniciativa foi de um professor da cidade, incomodado com o ambiente sujo dos pontos de ônibus, que resolveu dar um presente à população. Ele mesmo contratou um pedreiro e fez a reforma do ponto. Sem muita burocracia e com um gasto relativamente pequeno, criou-se um espaço urbano digno para as pessoas.
(Foto: Edu Fortes/AAN)
SubCentro Las Condes, Santiago, Chile
Trata-se uma galeria abandonada, próxima a uma estação de metrô, que se tornou um centro comercial com áreas verdes, cafés e galerias de arte. Em parceria com a subprefeitura da região e a companhia de metrô local, dois moradores conseguiram planejar, construir e inaugurar o SubCentro Las Condes. A organização Urban Development, responsável pela revitalização da área, faz a manutenção do local, que se tornou espaço de lazer e descanso para quem mora ou passa pela região.
(Foto: Ludmila Dias Fernandes)
Praça Benedito Calixto, São Paulo
A Feira da Praça Benedito Calixto existe desde 1987 e é um exemplo de iniciativa popular. Ponto de referência intelectual e cultural, o evento, que acontece todos os sábados, tem a participação de 320 expositores de artesanatos variados, obras de arte e antiguidades. Algo semelhante acontece em Porto Alegre com o Brique da Redenção, que todos os domingos fecha a rua José Bonifácio, ao lado do Parque Farroupilha, e atrai milhares de porto-alegrenses.
(Foto: Maria Melancia)
Fonte: This Big City. Este texto foi publicado originalmente no site The City Fix Brasil.
Leia também:
Por uma cidade com mais flores, boa e tranquila para se caminhar
Congestionamentos: pedágio, estacionamentos e o resgate dos espaços públicos
Praças e espaços públicos abertos de São Paulo ganham grades e muretas