Faixa exclusiva de ônibus em São Paulo: um bode na sala?

Reclamações de motoristas são inconsistentes e ignoram a matemática básica, escreve a jornalista Sabrina Duran

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Fonte: Época  |  Autor: Sabrina Duran  |  Postado em: 02 de setembro de 2013

Faixa exclusiva na região do Aeroporto de Congonha

Faixa exclusiva na região do Aeroporto de Congonhas

créditos: Letícia Macedo / G1

 

São Paulo ganhou hoje (2) mais duas faixas exclusivas para ônibus que contemplam 12 vias da cidade. A medida faz parte do programa "Dá licença para o ônibus", do governo municipal, cujo objetivo é priorizar o transporte público coletivo em detrimento do privado individual, reduzindo o tempo de viagem dos passageiros e melhorando a qualidade do serviço. Até o fim do ano, a prefeitura quer implantar 220 km dessas vias - desse total, 146 km já foram concluídos.

 

As faixas exclusivas de ônibus são apenas parte da solução para o problema da imobilidade urbana, assim como a bicicleta também é, o metrô, a melhoria das calçadas, etc. E sendo uma parte, não pode ser ignorada ou criticada simplesmente porque não é o todo, a solução definitiva para o problema da imobilidade. Esse todo é (será) resultado da integração de muitas partes, com planejamento e visão de longo prazo.

 

Por mais óbvio que seja este raciocínio, é curioso como ele ainda não é suficiente para convencer muitos motoristas de que priorizar o transporte público coletivo, ainda que não resolva todos os problemas de imobilidade da cidade, é algo bom para todo mundo, inclusive para ele, motorista parado no trânsito, sozinho em seu carro, maldizendo a faixa exclusiva enquanto os coletivos passam por ela sem serem atingidos pelo engarrafamento.

 

Se fizesse uma conta matemática simples, o motorista ressentido deixaria de reclamar e passaria a agradecer - se não por gosto, pelo menos por honestidade intelectual - quem teve a ideia de implementar a faixa exclusiva e quem usa o transporte coletivo para se deslocar. Se cada ônibus transporta uma média de 60 passageiros, que pior não seria a vida de quem está com o carro parado, por exemplo, no engarrafamento da av. 23 de Maio, se os 60 passageiros de um único ônibus também tivessem tido a ideia (ou a chance) de fazer aquele trajeto cada qual em seu próprio automóvel.

 

Que caos maior não seria a cidade se os 84 mil passageiros que circulam todos os dias em coletivos pela faixa exclusiva das ruas João Rudge e Zanzibar, na Casa Verde, resolvessem sair de casa de carro. Ou se os 131 mil passageiros que passam por dia útil pela av. Água Fria, na zona norte, tivessem a mesma ideia - isso só para citar duas faixas exclusivas recém-instaladas em São Paulo.

 

E que inferno não teria sido a sua vida e a minha se cada um dos 232 milhões de passageiros transportados em ônibus coletivos durante o mês de julho tivessem resolvido se deslocar pela cidade de carro, cada qual em um.


Bode na sala*
As queixas que tenho ouvido de motoristas contra as faixas exclusivas para ônibus dão conta de que elas são o "bode na sala" para quem se desloca majoritariamente de carro. Em resumo, alguns motoristas dizem que não há trânsito tão ruim que não possa piorar.

 

De fato, não há. Mas a causa da piora não são as faixas exclusivas de ônibus, e sim o próprio uso irracional do carro, incentivado pelas décadas de investimento massivo em estrutura viária que prioriza o transporte motorizado individual. E nem precisamos ir longe na explicação para provar esse ponto. Basta ir pra rua de carro e perder uma média de duas horas de vida todos os dias sem sair do lugar, preso dentro de uma lata, respirando monóxido de carbono e sentindo crescer no corpo os níveis de estresse.

 

A faixa exclusiva de ônibus, assim como qualquer outra intervenção viária que não foque no uso prioritário do transporte motorizado individual para melhorar a mobilidade, não é um mal necessário, mas parte da solução para o problema.

 

Na vida em sociedade, não há decisão pessoal que passe indiferente à vida coletiva, tanto mais quando o assunto é o problema da imobilidade urbana. Nesse caso, seja como pedestres, ciclistas, motoristas ou passageiros de coletivo, podemos sempre escolher um desses dois papéis: o papel de parte da solução ou o de bode na sala de alguém.

 

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Comentários

Reginaldo - 14 de Novembro de 2013 às 18:53 Positivo 3 Negativo 0

Se o exercicio é de matematica, façamos o inverso, peguemos 50% dos usuarios de automovel e joguemos para o transporte publico,ai lhe pergunto se o sistema comporta? sendo o transporte de pessima qualidade e os passageiros transportados como gado.

Olavo Clark - 09 de Setembro de 2013 às 17:07 Positivo 1 Negativo 0

Estas tem seus custos operacionais reduzidos (combustivel), sem colocar um unico onibus a mais nas ruas. Mostrar isso é estar a serviço da sociedade. Preciso é que olhemos mais a frente daquilo que se mostra e que a compreensão seja do todo!

Olavo Clark - 09 de Setembro de 2013 às 17:06 Positivo 1 Negativo 0

Criar corredores em avenidas não é priorizar o transporte publico, mas criar uma imagem de ação em meio ao 'dolce fa niente' da prefeitura. As faixas fingem beneficiar as pessoas, mas beneficiam as empresas de onibus, apenas.

Olavo Clark - 09 de Setembro de 2013 às 17:04 Positivo 1 Negativo 0

Se devemos olhar para a vida em comunidade, parece errado punir alguns para beneficiar outros. Vejo como correto pedir transporte público de qualidade e que funcione, não sendo o onibus o caso, mas sim o transporte sobre trilhos, organizado.

Olavo Clark - 09 de Setembro de 2013 às 17:02 Positivo 2 Negativo 0

Criticar o transporte individual como sendo um crime, parece uma forma de cercar o direito de uma pessoa que vive em sociedade como você. Se o transito piora como um todo, mas os onibus andam mais rápido, é sintoma de que as pessoas não aderiram.

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