Mais do que locais voltados para os pedestres, as praças da cidade do Recife têm se transformado em pontos de estacionamento legalizados pelo município. Em algumas, o acesso das pessoas ao espaço público fica limitado. Pelos dados da Companhia de Trânsito e Transporte Urbano (CTTU) quatro praças no Centro dispõem de Zona Azul. A relação do órgão não cita, por exemplo, a Dom Vital, no bairro de São José, em frente ao mercado.
A equipe do jornal Diário de Pernambuco visitou esse espaço e também as praças do Arsenal e da República para verificar a relação delas com a população. Em comum, o fato de serem cercadas pelos automóveis. Apesar do desconforto que a situação provoca, o pedestre segue sem muita reclamação e parece desconhecer que esses locais deveriam ser seus por excelência. Já os urbanistas criticam a opção preferencial pelo carro em um território que existe para ser, essencialmente, das pessoas.
Pedestres sem espaço
Localizada em uma área histórica de São José, em frente ao mercado e servindo praticamente de largo da Igreja da Penha, a Praça Dom Vital é cercada de automóveis. Os estacionamentos permitidos fazem um “L” ao redor do logradouro. Além de ser um espaço de integração, a praça também é ponto de passagem de quem circula entre o comércio da Rua das Calçadas e o mercado. Sem falar na feirinha de frutas e verduras e do comércio ambulante. O espaço fervilha de pessoas e carros.
Em meio a uma área de grande movimentação, o pedestre é obrigado a passar espremido entre os veículos. A turismóloga Bruna Feitosa, 24 anos, já havia observado a tendência da cidade em disponibilizar espaço para os carros até mesmo nas praças. “Em outras praças da cidade, essa mesma cena se repete. O pedestre tem cada vez menos espaço”, reclamou.
Um “arsenal” de veículos
Em um dos pontos mais turísticos do Recife, a Praça do Arsenal tem estacionamentos com aval do município. As vagas no entorno são disputadas. A maioria dos empreendimentos localizados em áreas históricas não dispõe de estacionamento próprio e a praça e as ruas acabam sendo as opções. Depois de estacionar o carro, a funcionária pública Claudileide Vieira, 49 anos, admitiu que a presença do veículo atrapalha a mobilidade e estraga a beleza do lugar. “Não deveria ser um lugar para os carros. Prejudica o visual, tira a privacidade para as conversas e afeta a circulação”, enumerou. Para a professora do Laboratório de Paisagismo da UFPE, Ana Rita de Sá Carneiro, os carros são uma séria barreira. “É importante ter a visualização da praça. Até por uma questão de segurança, pois fica difícil para o pedestre perceber a calçada, principalmente o deficiente físico”, criticou.
República tomada
A Praça da República, entre o Palácio do Governo e o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), é um dos maiores símbolos do Centro. A sua origem remonta a 1639, quando Maurício de Nassau iniciou o plantio de um parque. É considerada o primeiro jardim renascencista das Américas. Mas hoje é, principalmente, um espaço para estacionamento. Entre os dois lados da praça, uma via ficou segregada para os carros, que fazem fila no entorno aguardando a vez. A urbanista Virgínia Pontual, professora do Departamento de Pós-graduação de Arquitetura da UFPE, fala sobre os prejuízos dessa opção para a cidade. “Os carros funcionam como cerca e algumas praças já têm até grades. Quem precisa de um lugar para estacionar deve pagar por isso. Esse espaço deve ser devolvido às pessoas”, reforçou. O Diario tentou falar sobre as praças com a presidente da CTTU, Taciana Ferreira, mas não obteve retorno.
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