Um dos principais desafios do gestor do sistema de transporte público urbano de passageiros, tanto do metrô quanto do ônibus, é levar em conta critérios que apliquem uma política tarifária economicamente viável e socialmente justa.
Nessa perspectiva, a melhor maneira de estabelecer uma política tarifária é separar o valor da tarifa pública do custo do serviço. Assim, cabe ao poder público (órgão gestor) a definição do nível de serviço (frequência, conforto, confiabilidade etc) a ser oferecido à população.
Essa é a opinião do presidente da diretoria executiva da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Otávio Vieira da Cunha Filho. “Obviamente, quanto maior for o nível desejado, maior serão os custos da operação dos serviços. O Capítulo II da Lei Federal 12.587, de 2012, é a referência legal para o entendimento desses critérios e decisões”, complementa.
Fórum de mobilidade em BH
O debate em torno da política tarifária é um dos temas que serão discutidos no Fórum Técnico Mobilidade Urbana – Construindo Cidades Inteligentes, da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), que está produzindo uma série de matérias sobre o assunto. Na avaliação de Otávio Cunha, a tarifa pública dos serviços de transporte urbano coletivo de passageiros deve ser um instrumento de política social. “Portanto, o valor da tarifa pública deve ser compatível com o poder aquisitivo daqueles que dependem do transporte público. A diferença entre o custo do serviço e a tarifa pública deve ser subsidiada pelo Estado. Esse custo deve ser repartido proporcionalmente com toda a sociedade”, diz.
“É inaceitável que um serviço público essencial, como é definido por lei o transporte coletivo, com características de mercado únicas, apresente índices de qualidade tão precários, com superlotação, descumprimento de quadro de horários e maus tratos aos usuários, principalmente idosos, crianças, pessoas com deficiência e grávidas”, critica o presidente da Associação dos Usuários de Transporte Coletivo de Belo Horizonte (AUTC), Francisco de Assis Maciel. Para ele, para além das obrigações legais, o setor público tem todas as condições de exigir um transporte coletivo de qualidade e de baixo custo, sob pena de prevaricação. "Essa lógica perversa onde custo é igual a receita impossibilita uma política tarifária e impõe uma abusiva política de reajuste tarifário", completa.
"Considerando a Lei 12.587, que institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, a política tarifária tem como diretriz a melhoria da eficiência e da eficácia na prestação dos serviços e deve ser instrumento da política de ocupação equilibrada da cidade, de acordo com os Planos Diretores Municipal, Regional e Metropolitano", diz o deputado Ivair Nogueira (PMDB). Um dos pontos que ele destaca é a transparência da estrutura tarifária para o usuário, que deve saber o quanto custa exatamente o serviço prestado, considerando aí gastos na manutenção de um serviço seguro e de qualidade.
Sobre o desafio de implantar uma boa política tarifária, o gerente de Controle e Estudos Tarifários da BHTrans, Sérgio Luís Ribeiro de Carvalho, entende que diversos critérios devem ser considerados. “Além do atendimento às necessidades de deslocamento dos usuários e da viabilidade econômica do sistema, deve-se avaliar a tecnologia disponível, a diretriz de governo, a rede viária e de transportes existentes, dentre outros aspectos socioculturais da região a ser atendida”, observa.
Entre tantos critérios que definem a política tarifária, Carvalho destaca o tipo de tecnologia disponível. Ele comenta que a utilização de sistemas de bilhetagem eletrônica, por exemplo, traz a possibilidade de realização de integrações tarifárias com a aplicação de diversas regras de validação. Outro fator a ser levado em conta, em sua opinião, é a condição sociocultural da população a ser atendida pela rede urbana de transportes. “O costume da população pode interferir em diversas questões, como, por exemplo, a definição do embarque pela porta dianteira ou traseira, a maior ou menor facilidade de absorção da tecnologia de bilhetagem e de entendimento da política tarifária mais ou menos complexa”.
Custos do sistema de transporte público são cobertos pela receita
Enquanto a receita é a tarifa arrecadada no ano, o custo é tudo que está previsto na planilha calculada para manter a rede de transporte coletivo funcionando durante um ano, de acordo com a frota, o itinerário e o quadro de horários previamente definidos. Para entender a equação entre custo e receita no transporte público, o presidente da Associação dos Usuários de Transporte Coletivo (AUTC) de Belo Horizonte, Francisco de Assis Maciel, oferece um exemplo: como será calculada a tarifa (receita) de 2014? “Soma-se todos os valores da planilha de custos do sistema de 2013 e divide-se pelo número de pagantes/passageiros de 2013. Simples assim: (custo/pagantes = tarifa). Portanto, o custo é que determina a receita numa regra de três simples diretamente proporcional, ou seja, a receita é definida para cobrir o custo”.
“Infelizmente não temos um Plano de Mobilidade, mas sim um Plano de Mercado da Mobilidade”, afirma Maciel. Segundo ele, é um mercado extremamente promissor do ponto de vista financeiro, pois supera até os limites de um modelo capitalista selvagem, onde prevalece a demanda cativa e compulsória, sem venda a prazo, portanto, sem inadimplência, em que todos os custos do sistema são cobertos pela receita desse mesmo sistema.
“Dessa forma, o custo é igual à receita. Isso significa que qualquer oscilação positiva no custo da operação do 'negócio' será reembolsada no cálculo da passagem que aumenta, e qualquer oscilação negativa no custo dessa operação será apropriada como lucro para as empresas, a título de economia operacional, sem redução da tarifa”, avalia. Maciel diz que desconhece outro ramo da economia em que o lucro seja garantido em planilha de custo. “Seja qual for o resultado do desempenho do negócio, a receita é garantida para cobrir o custo”, frisa.
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