Trânsito de São Paulo é ruim ou péssimo para oito em cada dez cidadãos

O Instituto Ressoar consultou dois especialistas em mobilidade urbana para saber as suas opiniões sobre iniciativas como o Dia Mundial sem Carro

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Fonte: Instituto Ressoar  |  Autor: Da redação  |  Postado em: 03 de outubro de 2012

Trânsito em São Paulo é um de seus principais prob

Trânsito em São Paulo é um de seus principais problemas

créditos: Divulgação

 

Como parte das atividades programadas para a Semana de Mobilidade, que se estendeu até o dia 22 de setembro, quando se comemora o Dia Mundial Sem Carro, a Rede Nossa São Paulo e o Ibope lançaram a edição 2012 da Pesquisa sobre Mobilidade Urbana, que analisa a percepção do cidadão a respeito das principais questões que envolvem o trânsito na capital paulistana. 

 

A pesquisa revela que oito em cada dez paulistanos consideram o trânsito de São Paulo “ruim” ou “péssimo”, o que mostra um aumento da percepção negativa do cidadão desde 2008, quando o índice nessa questão era de sete entre dez entrevistados. 

 

O estudo também mostra que mais de uma hora e meia é gasta por cerca de um terço dos moradores da capital em seus deslocamentos para a atividade diária principal (estudos ou trabalho). O paulistano indicou, entre as prioridades de investimentos para diminuir os problemas de mobilidade, o investimento em linhas de metrô e trem e de corredores de ônibus. Um melhor sistema de transporte público, inclusive, seria motivo para 47% dos pesquisados deixarem os carros em casa. 

 

Em vista desses dados, o Instituto Ressoar consultou dois especialistas em mobilidade urbana para saber as suas opiniões sobre iniciativas como o Dia Mundial sem Carro e o que deve ser feito para alcançar condições dignas de mobilidade urbana na cidade mais populosa do país. Abaixo, você sabe mais sobre o que Thiago Guimarães, consultor editorial do portal sobre mobilidade urbana sustentável Mobilize Brasil (www.mobilize.org.br) e professor e pesquisador do Instituto de Planejamento de Transportes e Logística em Hamburgo, na Alemanha e Ricardo Corrêa, arquiteto, urbanista e sócio fundador da TC Urbes, consultoria especializada em projetos de mobilidade, acessibilidade e requalificação do espaço público urbano, pensam sobre o assunto. 


Ressoar: Qual a sua opinião sobre iniciativas como o Dia Mundial Sem Carro? Elas são realmente efetivas para o alcance de uma melhor mobilidade urbana? 


Thiago Guimarães: Ao lado de outras atividades programadas para a Semana da Mobilidade, o Dia Mundial Sem Carro é uma iniciativa muito importante para conscientizar as pessoas sobre os problemas gerados pelo excessivo uso do automóvel e sobre a inviabilidade de um modelo que dá as costas para o transporte coletivo e não motorizado. Muitos brasileiros ainda pensam que, porque compraram um carro e pagam IPVA, podem dirigi-lo por onde, quando e da forma que quiser. Não é bem assim. Há limites para a boa convivência com outros “participantes do trânsito”. Essa é uma mensagem importante do Dia Mundial Sem Carro, que precisa continuar acontecendo pelo menos uma vez por ano, apesar da falta de apoio de prefeituras e de um relativamente reduzido número de participantes nos últimos anos. 

No entanto, o Dia Mundial Sem Carro alveja demasiadamente o motorista como o único responsável pela catástrofe urbana. Melhorar a mobilidade urbana depende efetivamente de muitos outros fatores, que são relativas, sim, a iniciativas individuais (como a do motorista que se abre para outras opções de transporte), de ações da sociedade civil, mas também – e principalmente – de políticas públicas responsáveis. 

Ricardo Corrêa: O Dia Mundial Sem Carro evidencia o descompasso e as diferentes relações carro X cidade X sociedade. Esta relação fica evidente quando comparamos Los Angeles, nos EUA com Lagos, na Nigéria. 


Nos Estados Unidos o carro é um dos sinais de riqueza e na Nigéria é um dos sinais da pobreza, pois poucas pessoas têm condições de possuir e utilizar o carro cotidianamente. As duas cidades são grandes e planejadas para o uso do carro. Porém, quanto mais pobre o país, menor a parte da população que possuí um veículo particular, e, portanto, se alcança uma menos mobilidade. Desse modo um dia mundial sem carro tem diferentes significados, de acordo com a situação de cada país. 

Em um contexto global, acredito que qualquer ação local tem grande repercussão sobre esse modelo de mobilidade e sociedade. Mesmo que localmente pareça ter pouco significado, essa ação mostra a procura de um novo modelo de cidade no mundo todo, seja em países pobres ou ricos, cada qual com seus motivos. 

 

Ressoar: Quais são as principais medidas que precisam ser adotadas, tomando a cidade de São Paulo como exemplo, para melhorar os deslocamentos ao mesmo tempo em que se promove um desenvolvimento sustentável? 

Thiago Guimarães: Viver em uma metrópole como São Paulo é ser torturado constantemente pelo barulho das ruas, ter de respirar um ar nojento, conviver com índices aviltantes de mortes e acidentes de trânsito, e perder muito tempo em deslocamentos triviais, como os entre o local de residência e o local de trabalho ou o estudo. Todas as medidas que contribuam para o fim desse massacre são prioritárias, pois ajudam a colocar São Paulo em uma rota de desenvolvimento urbano sustentável. 

Mas essas medidas não devem ser buscadas apenas na área dos transportes. É fundamental elaborar e executar uma estratégia de desenvolvimento espacial que promova a desconcentração de atividades produtivas da região central e o repovoamento de bairros que são bem servidos de infraestruturas de transporte. Bem como é fundamental abrir os olhos para o estado lastimável de grande parte de nossas calçadas, tornando o simples caminhar uma atividade mais segura e prazerosa. 

A atitude mais digna do próximo prefeito de São Paulo na área da mobilidade seria, no dia de sua posse, caminhar de sua casa até a prefeitura – e aproveitar para iniciar um mapeamento das irregularidades encontradas nas calçadas ao longo desse trajeto. 

Ricardo Corrêa: A Politica Nacional de Mobilidade Urbana coloca logo no principio, em seu capítulo I, Art. 1º, paragrafo único, a necessidade de integração entre os modos de transporte. Ou seja, os modos de transportes devem ser pensados de maneira articulada e integrada, onde, dependendo do trajeto se utiliza um meio de transporte diferente, sozinho e/ou conjugado, como, por exemplo, o uso de bicicleta e ônibus ou carro e metrô. 


Para que se criem essas facilidades é preciso melhorar os sistemas de transporte coletivo e criar um sistema cicloviário que dê conforto e segurança ao usuário. Pois, comparado, a esses sistemas o carro é muito menos eficiente para deslocamento em áreas urbanas. A exemplo dos tempos do desafio intermodal (ver notícia AQUI) em que a bicicleta está sempre em primeiro ou segundo, perdendo, por vezes, para o helicóptero, e o carro aparece em último, junto ao pedestre. 


Ressoar: Existem exemplos de medidas tomadas em cidades, no Brasil ou em outros países, que possam servir de exemplo para a capital paulista? Quais? 

Thiago Guimarães: Há muitos exemplos nacionais e internacionais de boas práticas de planejamento urbano e de transporte bem sucedidas. São projetos inspiradores, muitos deles já batidos, muito conhecidos. Com os recursos de comunicação à disposição hoje em dia, o problema não é falta de acesso à informação sobre esses projetos, sobre essas "cidades-modelos". O problema da mobilidade em cidades brasileiras também não precisa ser resolvido com ideias muito inovadoras, revolucionárias. Os problemas estão à vista, são reconhecidos e vivenciados por qualquer cidadão. Na área da mobilidade, muito mais importante é vontade política e capacidade administrativa para fazer coisas simples, quase óbvias, como assegurar o bom acesso de pedestres, oferecer um transporte coletivo de qualidade, estabelecer uma política de estacionamentos e regulamentar velocidades considerando as estruturas urbanas. 

Ricardo Corrêa: Exemplos sempre existem, porém, o que importa são as diferentes realidades politicas e sociais, ou seja, é preciso ter vontade politica. Por exemplo, na década de 1970, Curitiba foi um exemplo de inovação em relação ao eficiente modelo de transporte de ônibus implantado. Passaram 40 anos e esse modelo não foi expandido para o território nacional, modelo esse condizente com a nossa realidade muito mais que modelos europeus. Enquanto isso alguns países como a Colômbia, com muito mais entraves sociais e financeiros, vem implantado o modelo de transporte de ônibus de Curitiba em todas suas grandes cidades. E isso é fruto da coragem politica. 

 

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