A história se repete a cada ano de eleição. Para angariar votos, candidatos fazem promessas sem ter ideia de como concretizá-las. Em alguns casos, os políticos precisariam fazer verdadeiros milagres com o orçamento previsto para o ano seguinte. No Rio, algumas ideias chamam a atenção pela ousadia. Os aspirantes a prefeito bancam propostas que vão desde passagens de ônibus a R$ 1 à construção de uma universidade de medicina na zona oeste.
A prefeitura estima que, no ano que vem, o município tenha à disposição montante que deve passar de R$ 21 bilhões. Desse total, o chefe do Executivo terá que destinar para cada setor os recursos mínimos previstos na Constituição Federal, como 25% para educação e 15% para saúde. Para equilibrar as contas da cidade, que entrou em contagem regressiva para os Jogos Olímpicos de 2016, o futuro prefeito terá que fazer malabarismo para viabilizar suas promessas mais audaciosas.
O cientista político Vitor Marchetti, professor da Universidade Federal do ABC, diz que o discurso dos concorrentes à Prefeitura do Rio mostra que, em geral, os candidatos desconhecem o funcionamento da máquina administrativa. De acordo com Marchetti, é comum os postulantes fazerem promessas sem conhecer o orçamento previsto para o município.
— Às vezes, inclusive, fazem promessas que estão fora do alcance municipal, como projetos que são de responsabilidade das esferas estadual e federal.
O R7 analisou os planos de governo dos cinco primeiros colocados nas pesquisas eleitorais e verificou que a maioria dos documentos não detalha custos tampouco explica como tais propostas seriam concretizadas, em caso de vitória. A reportagem escolheu uma proposta de cada candidato e perguntou a ele o caminho a ser percorrido para torná-la viável.
Mais médicos, bondes de Santa Teresa e ônibus a R$ 1
Líder nas pesquisas de intenção de votos, o prefeito Eduardo Paes, que tenta reeleição pelo PMDB, prometeu abrir concursos públicos para a contratação de mais 2.000 médicos. Segundo o Sindmed (Sindicato dos Médicos do Rio), um médico concursado recebe em média R$ 2.500. Isso significa que a proposta de Paes custaria, só com vencimentos, cerca de R$ 5 milhões por mês. O candidato diz que estará de olho na Lei Orçamentária do município para preencher as vagas nas unidades de saúde nos próximos quatro anos.
— A estimativa é preencher as vagas por meio de concurso público, com previsão de convocações anuais baseadas na Lei Orçamentária. Além disso, serão contratados profissionais celetistas que atuarão nas outras 70 clínicas da família que serão abertas até 2016, possibilitando o alcance de 70% na cobertura de atenção primária. Também há a previsão de contratação de outros profissionais de saúde, dentro das necessidades da rede municipal.
Segundo colocado na preferência do eleitorado carioca, o deputado estadual Marcelo Freixo (PSol) pretende municipalizar o serviço dos bondinhos de Santa Teresa, que é administrado pelo governo do Estado. Apesar de não manter uma boa relação com o governador Sérgio Cabral (PMDB), Freixo admite a possibilidade de assumir o controle do transporte contando apenas com o orçamento estadual. O parlamentar fala ainda na criação de um Fundo Municipal de Transportes.
— Em 2010, o governo estadual gastou R$ 80 milhões com a manutenção do sistema de bondes. Essa verba, se não fosse tão mal gasta, seria mais que suficiente para manter o sistema e até ampliá-lo. Com a nossa proposta de ampliar o controle sobre o RioCard e instituir o Fundo Municipal de Transportes, poderíamos ter mais autonomia e instrumentos financeiros para garantir não apenas a manutenção do bonde, como um maior controle público sobre os ônibus e vans.
O setor de transportes também é alvo de uma das principais propostas do candidato Rodrigo Maia (DEM). Em seu plano de governo, o democrata promete reduzir o valor das passagens de ônibus de R$ 2,75 para R$ 2,50. O deputado federal ainda se comprometeu a criar o “Domingão a R$ 1”, programa que vai baratear o serviço aos domingos. Para justificar suas ideias, Maia recorre às vantagens que, segundo ele, as empresas do setor tiveram com a instalação de corredores exclusivos (BRT e BRS) na cidade. O parlamentar, porém, não detalhou como compensar a perda financeira por parte das companhias.
— O grande benefício que as empresas tiveram e terão com os BRTs e BRS precisam ser repassados para a população carioca. Todas as avaliações indicam que o lucro das empresas de ônibus aumentaram. O transporte é público e a população deve ter um serviço de qualidade. A atual prefeitura elevou a tarifa para um valor muito alto e vamos corrigir esta distorção. Será por meio da redução da passagem de R$ 2,75 para R$ 2,50 e R$ 1 no domingo.
Universidade de medicina na zona oeste e Distritos de Saúde
Candidato do PSDB, Otavio Leite quer levar uma universidade de ciências da saúde, que vai englobar medicina, fisioterapia, enfermagem, odontologia, nutrição e fonoaudiologia, para a zona oeste do Rio. Autor da lei federal que obriga os políticos a registrarem suas promessas de campanha na Justiça Eleitoral, o tucano se preocupou em dar mais detalhes sobre o processo que tornará viável a sua proposta. O deputado já escolheu, inclusive, um terreno vizinho ao Hospital Municipal Pedro 2º, em Santa Cruz, para abrigar a instituição.
— A prefeitura constrói o prédio, que não deve passar de R$ 20 milhões. A prefeitura tem esse dinheiro. Depois partimos para um chamamento público [licitação] para saber quem quer instalar uma universidade ali. Ganha quem oferecer as melhores condições de manutenção e ensino. Vamos bancar as cem primeiras vagas do vestibular. Cada vaga em um curso de medicina custa R$ 4.000 [R$ 5 milhões ao ano]. Esses alunos irão, em contrapartida, devolver o investimento que receberam em horas de atendimento de hospitais, postos de saúde e clínicas da família.
Já a deputada estadual Aspásia Camargo (PV) planeja seguir à risca a orientação da ONU (Organização das Nações Unidas) que recomenda ao menos um posto de saúde para cada 250 mil habitantes. Considerando que o Rio tem uma população de 6,5 milhões de pessoas, a candidata calcula construir 26 novas unidades, que ela chama de “Distritos de Saúde”. A parlamentar, no entanto, não explica com que recursos pretende colocar esses espaços de pé. Para se ter uma ideia, cada clínica da família custa, em média, R$ 2,5 milhões aos cofres municipais.
— A rede é distribuída irracionalmente. Não há integração entre as redes municipal, estadual e federal e, por conta disso, a população nunca sabe onde deve se dirigir. Por isso, proponho que em cada distrito uma unidade hospitalar sirva como referência e, criada uma Central de Regulação para os hospitais das três redes, a população saiba onde exatamente deverá ser atendida.
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