Graduado em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-EAESP), com mestrado em Sustentabilidade pela Universidade Politécnica da Catalunha e MBA Executivo pela Universidade de Barcelona, Ricky é um dos responsáveis pela elaboração dos projetos do portal Mobilize – Mobilidade Urbana Sustentável, que entre fevereiro e abril realizou o Levantamento Calçadas do Brasil. O trabalho foi desenvolvido por uma equipe de mais de 20 profissionais coordenados por Ricky que, teoricamente, teria uma séria limitação: a esclerose lateral amiotrófica, doença degenerativa que lhe tirou todos os movimentos, sem afetar sua mente.
Hoje, Ricky Ribeiro se comunica por meio de um equipamento, o tobii eye, um leitor óptico que interpreta os movimentos da pupila. "Criei uma tabela de comunicação com palavras usuais e outra com o alfabeto para me comunicar quando não estou no computador." A doença é a mesma do físico Stephen Hawking, um dos principais cientistas do mundo.
A esclerose se manifestou em 2008. "Trabalhava e morava no Recife, costumava correr na praia, andar de bicicleta, fazer esportes, mas comecei a sentir que a perna falhava e às vezes eu caía." Foram seis meses entre os primeiros sintomas e a descoberta da doença.
Um choque
"No dia em que recebi o diagnóstico, entrei na internet, li sobre a doença e tudo era negativo. Foi um choque, fiquei muito triste e chorei. Mas minha tristeza durou apenas um dia." Já no dia seguinte reagiu. "Foquei em duas coisas: tentar combater a doença de todas as formas possíveis e escolher atividades prazerosas para fazer quando não estivesse em tratamento."
Acupuntura, medicina ortomolecular, transplante de células-tronco, tratamento espiritual, medicina alemã, além de fisioterapia, fono, terapia ocupacional etc. Tentou de tudo. "Também fiz curso de fotografia, aula de política, estudei, visitei parques e equipamentos culturais pela cidade, dividi apartamento com minha irmã, viajei enquanto pude e encontrei muito meus amigos." Segundo ele, tudo foi mais fácil porque tem "o privilégio de ter uma família que nunca mediu esforços para buscar todas as alternativas de tratamentos e lazer".
Cidadania
Após um ano de dedicação aos tratamentos, resolveu partir para uma ação mais social. "Comecei a pesquisar sobre mobilidade urbana sustentável." Encontrava apenas poucas informações espalhadas pela internet. "Percebi que não existia um único endereço eletrônico que reunisse todos esses dados e idealizei o Mobilize, que concretizei com a ajuda de amigos."
Da ideia até o Mobilize no ar foram oito meses. O portal é parte da Associação Abaporu, que Ricky e dois amigos criaram em 2003 para atuar em projetos sócio-educativos em educação e cidadania.
Referência
Segundo ele, a intenção é fazer do Mobilize, que entrou no ar este ano, referência na geração de conteúdo sobre mobilidade urbana sustentável, fomentar o debate público sobre a temática e "disseminar uma cultura cidadã participativa em prol da melhoria da qualidade de vida nas cidades".
Os resultados já estão aparecendo. "Lançamos o site com o Estudo Mobilize 2011, um diagnóstico inédito da mobilidade urbana no Brasil." A campanha das calçadas surgiu após a constatação, nesse estudo, de que 30% dos deslocamentos diários nas cidades são feitos a pé. "Quando buscamos dados sobre as condições das calçadas (acessibilidade, obstáculos, pavimentação, iluminação...), nenhum órgão público dispunha das informações. Criamos a campanha com o objetivo de chamar a atenção para um tema tão básico, mas esquecido por todos: afinal, todos somos pedestres!"
Calçadas
O relatório final da Campanha Calçadas do Brasil deve ser entregue formalmente para autoridades dos Ministérios Públicos (Estadual e Federal) e Ministério das Cidades. Foram avaliados 102 endereços de 12 capitais brasileiras. A situação mais alarmante é a da Ladeira da Fonte, em Salvador, que obteve nota 0,25 de um total de 10. O melhor no ranking foi o Calçadão da Barra, com a maior nota (10), a mesma da Avenida Faria Lima (uma quadra após a Avenida Europa), em São Paulo. "Estamos fazendo a nossa parte como cidadãos. Cabe aos governantes fazerem a parte deles também."
Os planos não param: para a Semana de Mobilidade Urbana, em setembro, o Mobilize lançará uma nova seção, a Acompanhe a Mobilidade nas Cidades. “Será um instrumento para que qualquer pessoa possa conhecer as obras e cobrar o cumprimento de promessas e prazos.”
Mobilidade
Ele ressalta que o tema mobilidade, com certeza, está ganhando evidência pela proximidade da Copa, em 2014, e das Olimpíadas, em 2016. "O Brasil tem uma excelente oportunidade para mostrar sua competência. Por outro lado, tem também uma grande responsabilidade."
Será a chance, conforme Ricky, de reverter "décadas de descaso dos governos com políticas públicas que priorizassem o transporte coletivo sustentável como metrô e trens, valorizassem o caminhar como meio de locomoção e preservação da saúde e incorporassem a bicicleta como meio de transporte".
Ou seja, hora de o Mobilize e Ricky arregaçarem as mangas de novo. "Perdi os movimentos, mas tenho o privilégio de ter todo o tempo para pensar. Até o mês passado, ficava oito horas por dia trabalhando no Mobilize. Agora, após uma broncopneumonia e uma internação, ganhei uma traqueostomia, estou em tratamento, mas já vou voltando a trabalhar no Mobilize".