Depois de passar pela cidade de São Paulo, o leitor Hélio Milani Filho escreveu um desabafo sobre o que viu e experimentou no centro da capital paulista. A degradação urbana, problema comum à maioria das capitais brasileiras, é realmente chocante para as pessoas que conheceram essas cidades há apenas trinta anos. Milani reitera aquilo que milhares de cidadãos brasileiros denunciam, todos os dias, às autoridades de todo o país. Com a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016, o país estará sob as luzes da imprensa mundial, com todos esses problemas em destaque.
"Provavelmente vou receber 1.000 cartões vermelhos devido aos meus comentários, mas realmente tenho que expressar meu desapontamento com a atual situação no Brasil.
Nasci em São Paulo, sou naturalizado australiano e moro em Sydney há muitos anos. Sempre tive orgulho da minha cidade natal, seu dinamismo, cultural, culinária etc. Estive de passagem em São Paulo por três dias e estou extremamente envergonhado e preocupado com a situação. Me hospedei no centro da cidade e, comparado a níveis internacionais, a cidade está um lixo.
Os monumentos e obras de arte que um dia foram motivo de orgulho estão delapidados, pichados, destruídos. As praças e alamedas não têm nenhum tipo de paisagismo, sequer grama. As ruas estão imundas, com lixo por todos os lados. O cheiro de urina e a quantidade de moradores de rua é alarmante, não dá sequer para sacar dinheiro em um caixa eletrônico, pois estas áreas dos bancos viraram dormitórios. Em uma saída a uma cervejaria, fui abordado 16 vezes por pessoas pedindo dinheiro.
E como se não bastasse a falta de um transporte eficiente de Guarulhos ao centro da cidade, a sala de espera do Expresso Aeroporto, na Praça da República, é pior do que um terminal de quinta categoria. As calçadas são irregulares, quando não inexistentes, e a falta de educação e arrogância imperam.
Fui criticado por algumas pessoas por ter circulado apenas na região que chamaram a "boca do lixo" de São Paulo. Quer dizer então, que monumentos maravilhosos como o Teatro Municipal, a Estação da Luz, a Sala São Paulo, a Pinacoteca do Estado e o Edificio Copan, que é um dos marcos da arquitetura modernista de São Paulo, estão fora do alcance dos turistas, ou pior, dos próprios paulistanos? O que resta, se hospedar nos Jardins? Pena que só ouvi historias de arrastões a prédios e restaurantes. Quem sabe, então, a solução seria confinar os turistas aos hotéis da av. Marginal Pinheiros e criar autopistas cercadas de outdoors com lindas imagens do Brasil, de forma a evitar a visão das favelas e da degradação urbana, como no filme "Brazil" de 1985.
Na chegada à cidade, como todo viajante, queria sair rapidamente do aeroporto para rever a familia e amigos. Mas, na hora do retorno, quando se tem que sair de casa no mínimo cinco horas antes do voo - por causa do trânsito e do tempo de check-in - tive mais tempo para analisar o estado do aeroporto de Guarulhos. Acreditem: não há um assento sequer na área de embarque que não esteja rasgado, com buracos, e espuma saindo por todos os lados. No único café aberto, um a coca-cola custava R$ 7,70 e uma senhora na minha frente reclamava que a máquina de cartão de crédito estava quebrada e que os balconistas não tinham troco para dólar. Vale lembrar que a taxa de embarque passa de R$ 70.
Fico muito triste e preocupado em voltar para a Austrália com essa impressão. Uma copa do mundo ou uma olimpíada não se fazem apenas com a alegria do povo e paixão pelo esporte. O Brasil vai "pagar um mico" e mostrar ao mundo todo a vergonha do país, culpa não somente dos políticos, mas também de uma população que não sabe o que é cidadania e amor ao seu país e à sua cidade e de uma onda de megalomania que assola o país. Mas, como diria meu falecido pai, o pior cego é aquele que não quer ver."