Em evento nesta terça-feira (26), realizado no coração da indústria automobilística do país, o engenheiro Adriano Murgel Branco, ex-secretário de Transportes do estado de São Paulo, atribui grande parte dos problemas de mobilidade urbana ao poder econômico do automóvel: “O lobby em favor ao carro é poderosíssimo, embora pouco visível”. Ele lembrou que durante o governo de Olavo Setúbal (1975-1979), havia o projeto de 280 km corredor de trólebus. Hoje o sistema que atravessa quatro cidades conta com apenas 33 km de extensão.
Os comentários foran feitos durante o seminário “Transporte Coletivo: Mobilidade, Mobilidade e Saúde”, realizado na sede da Associação Comercial e Industrial de São Bernardo do Campo (SP). O encontro foi dedicado aos tema de eficiência do transporte, energias limpas e saúde da população.
Na área de saúde, o professor Paulo Saldiva, médico coordenador do Laboratório de Poluição Atmosférica da USP, afirmou que 113 mil mortes seriam evitadas anualmente na cidade de São Paulo se a poluição fosse reduzida em 10%. Saldiva disse que a poluição dos centros urbanos é mais prejudicial do que o cigarro, que é tão perseguido pelas autoridades brasileiras: "Deveria haver uma campanha para a desglamurização do veículo também", comparou Saldiva.
O consultor ambiental Vitor Servalli comentou a importância dos dois itens ligados a mobilidade urbana do documento final da conferência Rio + 20. Os artigos 132 e 133 do documento final da conferência pedem o transporte sustentável em massa, em sistemas multimodais, como trens, metrôs, BRTs e VLTs para aprimorar o crescimento econômico e acessibilidade. "Não existe sustentabilidade sem inovação e tecnologia", comentou o especialista.
“Não existe solução urbana com o transporte individual, mas mesmo assim os governantes continuam a oferecer subsídios para os combustíveis”, reclamou o pesquisador em planejamento e mobilidade, Adalberto Maluf Filho. Entusiasta do BRT (Bus Rapid Transit), ele avalia que o metrô nem sempre é a melhor solução para as cidades, seja pelo investimento ou alto custo operacional. “As cidades que mais estão evoluindo apostaram em corredores de ônibus”. Os exemplos citados foram todos de cidades em países emergentes, como Bogotá, na Colômbia, Cidade do México, além da cidade de Cantão, na China, onde o sistema BRT transporta 850 mil pessoas por dia. Ele acha que os corredores de ônibus (elétricos, díesel e híbridos) são mais fáceis de implantar, além de serem uma ótima solução política já que o tempo médio de implementação é de dois anos.
Ele acredita que a descontinuidade política é responsável por boa parte dos problemas e atrasos de obras de mobilidade nas cidades. “Alguns projetos sempre estiveram em pauta, porém nunca saem do papel. As gerações, que não viram os erros do passado, vão mudando e as mesmas promessas vão sendo feitas”, disse.
Maluf declarou-se crítico à utilização de sistemas de transporte elevados, como os monotrilhos, em função do impacto urbanístico que esse sistema gera nas cidades. Como exemplo, ele citou o elevado do Expresso Tiradentes, em São Paulo, e o monotrilho de Seattle, nos Estados Unidos, que empobreceram seus entornos. O pesquisador acredita que esse seja o caso do monotrilho do ABC, previsto para 2014.
Ele acha que o projeto não sairá do papel pois quando entidades, como Ministério Público e Tribunal de Contas da União, fecharem as contas de custos das operações, os orçamentos não vão fechar. “Eu duvido que existam empreendedores privados para investir tantos recursos sem garantia minima de tarifas e usuários. Se sair do papel, provavelmente vai ser um projeto muito polêmico e os usuários vão ter que pagar tarifas muito altas para subsidiar esse sistema”.