O professor de informática Allan Diego Batista tinha o hábito de viajar diariamente de motocicleta entre duas cidades do interior cearense. Há dois meses, passou a usar um meio de transporte menos poluente, que retirou o equivalente a seis ônibus das ruas.
Ele passou a ser usuário do Metrô do Cariri, o primeiro Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) da região. “Deixei de trafegar em uma rodovia perigosa (CE-292), de correr riscos com acidentes e com o trânsito, além de ter mais conforto”, conta Batista.
O VLT do Cariri funciona há mais de dois anos transportando por uma antiga linha férrea cerca de 1.400 usuários por dia. Ele percorre nove estações ao longo de 13,6 quilômetros em 40 minutos e liga as cidades do Crato e de Juazeiro do Norte, principais centros urbanos da região do Cariri, sul do Ceará.
Menos emissões
“A emissão de gases é muito menor. O modelo utilizado no Cariri tira seis ônibus bem mais poluentes das ruas. É considerado um veículo bem seguro, confortável e mais rápido”, explica o engenheiro mecânico e diretor de operações da empresa responsável pelo VLT do Cariri, o Metrô de Fortaleza (Metrofor), Plínio Saboia.
Soluções mais sustentáveis para as cidades, inclusive dos seus sistemas de transporte, são um dos temas a serem debatidos na Rio+20, a Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável, que acontece este mês no Rio de Janeiro.
O trânsito entre os moradores das duas cidades seja para trabalhar, estudar ou comprar é histórico e, antes, o transporte público era feito por uma linha de ônibus intermunicipal e vans. Saboia considera o VLT uma evolução dos antigos bondes elétricos. "Em outros países, os bondes foram se aperfeiçoando até chegar ao modelo de VLT. No Brasil, deixou de ser utilizado, e cada pessoa passou a ser locomover no seu carro", compara.
“Acho que o VLT ainda vai crescer muito pelo Brasil. É um transporte barato, polui menos que outros transportes, é mais rápido e confortável”, diz Geovane Araújo, um dos operadores do VLT. A implantação do metrô gerou, aproximadamente, 160 empregos diretos na região.
'Made in Ceará'
O pioneirismo cearense em "resgatar o bonde" chamou a atenção de outras cidades brasileiras, como Recife, Maceió, São Paulo, Rio de Janeiro e Macaé. As empresas e governos interessados no modelo viajam ao Ceará para conhecer a fábrica, o trem e as estruturas das estações. Os três veículos, com duas composições cada, foram montados pela empresa Bom Sinal, no município de Barbalha, a 28 quilômetros de Juazeiro do Norte.
As peças de tração dos trens são importadas da Alemanha, mas a integração das partes e dos sistemas é toda feita no Ceará. “O VLT é 80% feito no Ceará, é uma tecnologia nacional”, afirma o diretor de operações do Metrofor.
A linha férrea usada para o transporte de cargas da linha Transnordestina foi remodelada para receber o novo veículo e a prioridade no trecho tornou-se a locomoção de passageiros.
Os engenheiros decidiram utilizar o modelo com motor movido a diesel, em vez do elétrico, pelo fato de os custos serem mais baixos. Segundo o governo do estado, o valor total da implantação foi de R$ 25 milhões.
Economia
Os benefícios da chegada do VLT, com uma passagem no valor de R$ 1, são logo sentidos no bolso e no tempo dos usuários. “Gastava mais de R$ 85 de gasolina e, hoje, não chego a gastar nem R$ 60 por mês indo trabalhar”, diz Allan Batista. A colega de trabalho do professor e usuária do VLT, Fabiana de Alencar, também poupou quando substituiu o ônibus pelo trem e ganhou qualidade de vida.
“É climatizado, mais seguro e não é lotado como os ônibus. Em dez minutos, chegamos à escola. A gente percebe também a mudança para os estudantes. O trem facilitou muito a vida deles, que sempre precisam fazer uma atividade extra e não dependem mais de ônibus e da insegurança”, relata a professora de língua estrangeira e empreendedorismo.
“Além de remodelar os trilhos, o entorno também passou por melhorias. Nesse percurso do trem, foram instalados escolas, supermercados e restaurantes”, diz a diretora do Metrô do Cariri, Dina Moreira. A Escola Estadual de Educação Profissional Raimundo Saraiva Coelho, onde os dois professores trabalham, foi inaugurada em agosto de 2011, ao lado da passagem do VLT.
Subutilizado
Mesmo com as mudanças nas rotinas de Allan, Fabiana, e de muitos estudantes, o metrô do Cariri ainda é subutilizado. A meta do Metrofor é que de 2.500 a 3.000 pessoas sejam beneficiadas diariamente com o trem. Por ter reaproveitado o caminho da linha férrea construída há mais de 50 anos, o VLT não passa pelas áreas centrais das cidades. Para chegar às estações, a maioria dos usuários precisa tomar um ônibus, pagando duas passagens.
O Metrofor informou que estuda um projeto de integração no metrô da região. "Quando os transportes estão interligados, há um aproveitamento bem melhor”, afirma o diretor Plínio Saboia. Segundo o governo estadual, não há previsão para a integração se concretizar.
Além da falta de integração, as viagens de metrô estão mais difíceis por causa da demora de uma viagem para outra. A espera média de um usuário, que deveria ser de 40 minutos, agora é de uma hora e vinte minutos, porque apenas um trem está em atividade. Dois veículos foram danificados em colisões com automóveis e estão parados para reformas. O Metrô do Cariri funciona com três veículos, dois em atividade e um sobressalente. Segundo a diretora Dina Moreira, a situação deve ser normalizada ainda em junho.
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