Para que o “Feliz 2040!” que o prefeito Gilberto Kassab desejou à cidade (jornal Folha de S. Paulo, em janeiro) se concretizar, será preciso mudar o quadro estático do poder público.
Em 2010, foi criada a Frente Parlamentar em Defesa da Mobilidade Humana (projeto nº 03-0012/2010) com caráter “temporário até o fim desta legislatura”.
Apesar de o mandado dos vereadores estar chegando ao fim, o projeto ainda precisa passar em plenário para ser posto em prática. Para o ex-secretário municipal de transportes de São Paulo, Frederico Bussinger, quem ocupa cargo público tem muito menos poder do que parece. “Na democracia brasileira, outros atores interferem – além do necessário – na concretização dos projetos, como os licenciadores ambientais e o tribunal de contas”, completa.
Para os paulistas, o problema da mobilidade é um dos grandes desafios da metrópole. Os dados são da pesquisa “SP 2040 – A cidade que queremos”, do professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, James Whright. Dos 808 participantes (de 31 subprefeituras), 19,83% acreditam que a aproximação da moradia com o emprego é o principal desafio para 2040. Dentre os projetos catalisadores apresentados pelo levantamento, a “Cidade em 30 minutos” ficou em segundo lugar, com 20,92% – as questões ambientais e de sustentabilidade ficaram sempre à frente nas respostas.
Mobilidade x distribuição populacional
O problema é que enquanto a densidade populacional nas periferias cresce, os empregos continuam concentrados no centro da cidade. De acordo com a pesquisa “Distribuição da população na região metropolitana de São Paulo”, o número de habitantes por hectare no Centro está em queda, enquanto nas zonas Leste e Sul há um crescimento de até 124%.
Por conta disso, a melhoria no transporte público já não é a única medida visada pelo poder público. Fazer com que a periferia não seja apenas uma região dormitório também está nos projetos da Câmara. “A ideia é criar incentivos fiscais para que empresas e comércios se instalem em regiões mais afastadas, como o projeto em Itaquera, aprovado recentemente”, conta o vereador Marco Aurélio Cunha (PSD).
A mudança também pode ser feita na região central. Um dos objetivos da Frente Parlamentar em Defesa da Mobilidade Humana é atrair mais de 400 mil moradores, nos próximos 20 anos, para a região entre a Lapa e o Brás, onde hoje só há 20 habitantes/hectare. “Se todo mundo da Zona Leste conseguir emprego, novas ‘zonas lestes’ surgirão. Não bastam planos, é preciso repensar a sociedade”, diz Bussinger. Por isso, empresas privadas também são responsáveis pela mudança.
A Editora Globo, por meio do projeto “Sei Ler”, em parceria com a fabricante de papel finlandesa StoraEnso, é exemplo de como é possível interferir nos números mesmo longe do poder público. Segundo pesquisa da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), os caminhões estão vazios em 46% das viagens realizadas. As carretas da StoraEnso também voltavam para Arapoti (PR) vazias; agora elas levam revistas que não foram vendidas para escolas da região rural. “O projeto é educacional, mas reflete na questão de transporte. Neste ano, vamos ampliá-lo: serão 246 mil revistas entregues a 24 mil alunos de oito cidades diferentes”, conta Vania Weber, diretora de finanças e recursos humanos da editora.
“O cidadão não pode ser só dependente do poder público. Eu sei o que é melhor para mim, então buscarei colocar em prática”, diz o vereador Ricardo Teixeira (PV). Mas se os políticos não mudarem a realidade da cidade com incentivos fiscais para moradias no Centro e empregos na periferia, a população continuará de mãos atadas e presa às moradias baratas nas regiões mais afastadas e ao transporte público lento e irregular.
* Produzido originalmente para a 1a Conferência de Imprensa da Oboré (2012)