Rio traz conferência mundial de bicicletas, mas deixa de construir ciclovias

Velo-City começa hoje (12) na cidade que não investiu em novos trechos de ciclovias desde o início de 2017, e segundo os ciclistas descuidou da manutenção dessas vias

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Fonte: Época/ O Globo  |  Autor: Época  |  Postado em: 12 de junho de 2018

Parte da ciclovia Tim Maia interditada no Rio

Parte da ciclovia Tim Maia interditada no Rio

créditos: Fernando Frazão/ Agência Brasil

 

Começa hoje (12) na zona portuária do Rio a Velo-City, uma das maiores conferências mundiais sobre uso de bicicleta e mobilidade urbana. Pela primeira vez, o evento criado em 1980 pela Federação Europeia de Ciclistas é realizado na América do Sul. Mas a capital carioca está longe de ser um exemplo inspirador para as palestras e os debates que serão realizados ao longo de quatro dias no Armazém 3 do Píer Mauá. 

 

Apesar de ter a maior rede cicloviária do Brasil, com um total de 450 km de extensão, a cidade deixou de investir no sistema: nenhum novo trecho foi construído desde o início de 2017. E quem costuma pedalar reclama da falta de conservação das pistas.

 

Na Lei Orçamentária de 2018, a prefeitura prevê um investimento de apenas R$ 5 mil para implantação de ciclofaixas e de R$ 50 mil para a elaboração do Plano Municipal Cicloviário, uma espécie de projeto de incentivo ao uso de bicicletas em toda a cidade. O plano estabelece metas e prioridades e faz um inventário dos equipamentos existentes. No Portal da Transparência da prefeitura, nenhum desses gastos previstos aparece como efetuado.

 

A Secretaria de Conservação e Meio Ambiente admitiu ontem que o município não investiu em novas vias para bicicletas este ano, mas informou que espera a liberação de R$ 1 milhão para iniciar obras de implantação de 3,2 km de ciclovia e de faixa compartilhada em Sepetiba.

 

Estagnação após expansão

A prefeitura também diz que vai construir 20 km de ciclovias até 2020. Apesar de parecer uma extensão significativa após um período de um ano e meio sem investimentos, o número é modesto se comparado com o histórico de anos anteriores: entre 2009 e 2016, os corredores exclusivos para ciclistas cresceram 273,9 km. 

 

Os anos de maior aumento no sistema foram 2011 (73,9 km), 2012 (59,57 km) e 2013 (49,18 km). Em 2016, a rede cresceu 20,9 km, mais que o previsto para os próximos três anos.

 

Nos últimos nove anos, as despesas com projetos que, de forma clara, foram destinados à expansão de ciclovias e faixas compartilhadas corresponderam a R$ 29,9 milhões, segundo um levantamento feito em novembro de 2017 pelo gabinete da vereadora Teresa Bergher (PSDB), a pedido do jornal O Globo. 

 

Outros R$ 39,8 milhões foram gastos, entre 2014 e 2015, em um projeto de implantação de “ciclofaixas em áreas de encosta” — uma referência à Ciclovia Tim Maia, que desabou parcialmente no ano passado, provocando a morte de duas pessoas. O acidente é alvo de uma CPI na Câmara Municipal, e até hoje a ciclovia não foi totalmente reaberta ao público.

 

"A política de mobilidade para bicicletas no Rio não avança. É impressionante. Quando você fala de bicicleta, tem que envolver várias secretarias de governo, como Esportes, Educação, Conservação... Todas deveriam estar alinhadas com esse tema. Mas isso não acontece", afirma Raphael Pazos, fundador da Comissão de Segurança no Ciclismo do Rio de Janeiro, criticando o fato de as políticas para ciclismo estarem vinculadas somente à Subsecretaria de Meio Ambiente.

 

Professor da Uerj e especialista em Engenharia de Transportes, Alexandre Rojas diz que a cidade, apesar do relevo acidentado, tem grande potencial para o transporte por ciclovias: "Em vários países, a bicicleta é utilizada para deslocamentos de até uma hora. Um bom ciclista percorre quase 20 km a cada 60 minutos. Quem estuda o assunto considera 16 km uma distância viável. A partir disso, é melhor o uso de outro modal. Para quem, por exemplo, mora no Méier e trabalha no Centro, pedalar é uma boa opção", afirma Rojas, que reclama do abandono de políticas públicas para transportes alternativos. "O Rio não tem pensado a mobilidade. Este é um tema que deveria ser amplamente discutido."

 

Números do serviço de aluguel de bicicletas Bike Rio, operado pela empresa Tembici e patrocinado pelo Banco Itaú, dão respaldo às palavras do especialista. Após um aumento da quantidade de estações e de veículos disponíveis, o número de viagens cresceu 52%. Em abril de 2017, com 260 estações, foram feitas 107.959. Este ano, com 74 novos terminais, o sistema já contabilizou 163.609.

 

Pistas abandonadas 

A falta de conservação de boa parte das ciclovias cariocas é gritante. No corredor para bicicletas da Avenida Ayrton Senna, na Barra, buracos exigem atenção redobrada de ciclistas. Entre Botafogo e Humaitá, faixas estão sem pintura e esburacadas em muitos pontos. A prefeitura, entretanto, afirma que realiza reparos nas pistas:

 

“A manutenção é feita pelos contratos de conservação da cidade, divididos por Áreas de Planejamento (APs). A mais recente consistiu em reparos e nova pintura na ciclovia que vai de Copacabana até o Aterro do Flamengo (altura do Assador), finalizada na semana passada”, informou, em nota, a Secretaria de Conservação e Meio Ambiente.

 

Faltam bicicletários

Outro problema é a falta de bicicletários e de integração com modais. Apenas seis estações de trem, entre as 102 da Supervia, tem bicicletários, que somam 4 mil vagas. O metrô tem mais estações com bicicletários — 14, de um total de 41 —, porém menos vagas: 243. Nos dois sistemas, há restrições de horários para embarque com bicicletas (a partir das 21h, nos dias úteis, e nos fins de semana). Já as barcas liberam o transporte de bicicletas convencionais para usuários da linha Praça Quinze-Araribóia e de dobráveis para passageiros das demais.

 

Para Carolina Queiroz, da Associação Carioca pela Mobilidade Ativa (Mobi Rio), a necessidade do Rio de ter a bicicleta como alternativa de transporte ficou evidente com a greve dos rodoviários:

 

"Vemos o quanto a paralisação afetou a cidade, que depende muito dos ônibus. Mas quem já tem o hábito de pedalar enfrenta problemas como má conservação das pistas, sinalização precária e falta de segurança", declarou Queiroz.

 

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