Metrô de NY está tão atrasado que pessoas acabam chegando mais cedo

Derrocada do sistema: taxa de pontualidade do metrô despenca a níveis nunca vistos. Para chegar na hora nova-iorquinos passaram a acordar e sair de casa mais cedo

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Fonte: Gaúcha ZN/ The New York Times  |  Autor: Sarah Maslin Nir  |  Postado em: 16 de abril de 2018

Falha esta semana no metrô atrasou trens em mais d

Falha esta semana no metrô atrasou trens em mais de 1/2 hora

créditos: Rajvi Desai/Am NY

Zach Emig chegou tão cedo para pegar os filhos na escola primária no Brooklyn que transformou o refeitório em seu escritório de campanha eleitoral, trabalhando em discursos até que as aulas acabassem.

 

Christina Hart passou tantas manhãs esperando no frio para que a padaria onde trabalha em Manhattan abrisse, que agora toda a equipe chega lá mais cedo, solução adotada pelo proprietário para que ela não se demitisse.

 

E o guia de turismo Matt Apter teve que buscar refúgio contra as intempéries nas igrejas ao redor da Times Square, porque chega bem antes de seus clientes.

 

Os três têm algo em comum: todos usam o metrô de Nova York para ir aonde precisam. Sim, o mesmo transporte que se tornou alvo nas redes sociais, cheias de queixas recheadas de palavrões graças a seu desempenho lamentável e nada confiável. O mesmo metrô com uma taxa de pontualidade que despencou a níveis nunca vistos antes.

 

Mas a derrocada do sistema a uma insegurança crônica está tão enraizada na psique dos usuários que muitos estão compensando em excesso, adicionando tempo extra às suas viagens. Em um dos enigmas mais paradoxais que surge nesta cidade confusa, o metrô tem feito as pessoas chegarem mais cedo.

 

Porém, só porque às vezes o trem pode causar surpresa chegando no horário, isso não significa que os usuários ficam satisfeitos. "Porque aí você acaba ficando com raiva de ter chegado tão cedo!", disse Adanna Roberts, cabeleireira que calcula 30 minutos extras para ir do Brooklyn ao trabalho, no centro de Manhattan.

 

Os atrasos e as falhas – trens avariados, sinais de mau funcionamento, passageiros enjoados e incêndios nos trilhos – são registrados extensivamente, mas ninguém (talvez sem surpresa) mantém estatísticas das ocasiões em que o metrô é pontual.

 

"Você faz o sacrifício de acordar mais cedo para ir trabalhar, e se chega cedo, ninguém repara, mas quando se atrasa, é um problema", disse Eduardo Andrade, que vive em Williamsburg, Brooklyn, e trabalha no Lincoln Center. Ele reorganizou a vida da família em torno do metrô, fazendo seus dois filhos irem para a cama uma hora antes para que possa acordar mais cedo e ter mais tempo para a viagem até Manhattan.

 

Investimentos

Os passageiros têm boas razões para esperar pelo pior: apesar de um investimento de centenas de milhões de dólares e um plano de recuperação de emergência fortemente promovido pelo governador Andrew M. Cuomo, que controla o metrô, o sistema ainda vacila. Em janeiro atingiu um novo patamar, com apenas 58,1% dos trens chegando às estações na hora nos dias úteis. Os fins de semana não foram muito melhores, com 64,7 % entrando no terminal no horário certo, uma queda de quase 10 pontos percentuais em comparação com janeiro de 2017.

 

Com a piora do serviço, Apter, o guia de turismo, se mudou de Windsor Terrace, no Brooklyn, para Astoria, no Queens, para encurtar seu trajeto até as atrações da Times Square – mas, mesmo agora, ele se levanta todo dia à mesma hora do quando morava duas vezes mais longe.

 

"O primordial para um bom guia de turismo em Nova York é a pontualidade", disse Apter. Só que quando seu trajeto transcorre sem problemas, ele acaba chegando mais cedo – o que pode gerar alguns problemas. "Não tenho um escritório onde ficar", disse. Para compensar, antes de sair para encontrar um grupo, ele confia em seu conhecimento de guia turístico da cidade para identificar igrejas ou saguões de hotel onde pode se sentar e esperar.

 

Na Sweet Corner Bakeshop no West Village, onde Hart trabalha como barista, o metrô é responsável pelo transporte de toda a equipe, desde o padeiro até o chocolatier.

 

Para evitar chegar atrasada, Hart sai mais cedo de Bushwick, no Brooklyn – só que quando o metrô funciona como deveria, ela às vezes chega meia hora antes da abertura da loja, às oito – e fica tremendo do lado de fora, até que um dos padeiros venha com a chave. "Chegar no horário certo é algo meio mágico", disse ela.

 

Para evitar que Hart pedisse as contas, o proprietário adiantou o relógio da padaria: agora a loja abre, o brioche assa e o café é preparado 15 minutos mais cedo, tudo para tentar acompanhar as falhas de um sistema de transporte no qual os nova-iorquinos já não confiam mais.

 

"Os peões das obras, os padeiros, as enfermeiras, todo mundo acorda bem cedo e precisa de um espaço de tempo específico para chegar", disse Rodolfo Gonçalves, dono da padaria, que observou que agora paga hora extra aos funcionários para que comecem o dia mais cedo.

 

Ônibus (lentos) não são alternativa

Para algumas profissões, como os professores, enfermeiros e auxiliares de saúde, onde chegar atrasado não é aceitável e até mesmo pode representar um risco para os pacientes, adiantar-se é a única opção. Procurar uma alternativa em outros modos de transporte público da cidade não é necessariamente a resposta: os ônibus públicos de Nova York, operados pela mesma agência que supervisiona o metrô, alcançaram a distinção de ter a velocidade mais lenta de qualquer grande cidade do país.

 

Segundo Megan McCormick, professora em East Flatbush, Brooklyn, se atrasar, seus alunos ficam à toa, esperando o começo da aula, a menos que ela se vire para encontrar alguém para substituí-la. "Entro em pânico todas as manhãs. Quando saio do ônibus, fico aliviada porque sinto que estou finalmente no controle do meu horário", disse ela.

 

Para resolver a questão, ela triplicou o tempo dedicado ao que deveria ser um trajeto de 20 minutos de ônibus, mesmo que signifique chegar cedo para encontrar a escola vazia. Na sala de aula escura, ela normalmente ouve um podcast, mas uma vez testou uma nova massinha de modelagem. "Posso até ser considerada zen", disse ela.

 

Alguns passageiros dizem que chegar mais cedo tem suas vantagens. Dogan Baruh, corretor de imóveis de 41 anos, não inclui um intervalo de almoço no seu horário quando precisa ir mostrar um apartamento do outro lado da cidade, pois assume que, em algum momento do dia, o metrô vai deixá-lo na estação desejada mais cedo do que o esperado, e então vai poder fazer uma pausa para comer. Ele adiciona 15 minutos extras a cada viagem, e torce para ter um tempo livre. "O lado positivo é que finalmente consigo almoçar!", declarou.

 

O investidor Emig, que mora em Staten Island e está disputando uma cadeira de vereador pelo Partido Democrata para representar o 11º Distrito Congressional, faz grande parte de sua campanha por e-mail, que envia dos pequenos bancos na cantina da escola primária de seus gêmeos em Crown Heights, Brooklyn, onde se senta após chegar do escritório, em Manhattan. Ele conta que, à sua volta estão outros pais, encurvados nas mesas feitas para o tamanho das crianças, que também chegaram mais cedo, todos olhando para o celular até que os filhos sejam dispensados.

 

"Eu me lembro de que, uns dez anos atrás, você podia contar com o metrô para chegar no horário na maioria das vezes. Agora, o pior de tudo é simplesmente a incógnita", disse Emig.

 

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