Compartilhei recentemente com os colegas, membros do Comitê do Clima do Município de São Paulo, o artigo do International Council on Clean Transportation – ICCT sobre a recente aprovação do padrão tecnológico Euro 6 para todos os modelos de veículos pesados a diesel novos comercializados no México a partir de 2021 (www.theicct.org/blog/staff/soot-free-buses-and-trucks-for-mexico).
Houve lá uma grande resistência das montadoras durante o processo de negociação - semelhante à que ocorre aqui no Brasil, segundo o autor - em que pesem os amplos benefícios tecnológicos, ambientais e econômicos devidamente comprovados da adoção do Euro 6, e os graves problemas que afetam a performance ambiental dos veículos Euro V, por deficiência da regulamentação.
Trata-se também de um notável avanço para o atendimento da National Determined Contribution – NDC Mexicana - e não apenas para um transporte local urbano muito mais limpo, resultante da drástica redução das emissões de material particulado ultrafino cancerígeno (MP), e da real capacidade dos ônibus de Classe Euro 6 reduzirem eficazmente as emissões locais de óxidos de nitrogênio (NOx) no ambiente urbano. Isso se deve ao efeito climático da tecnologia Euro 6: além da pequena redução no consumo de diesel fóssil, em relação ao Euro5, em torno de 2 a 3%, a quase eliminação total do Black Carbon (BC) também tem relevante contribuição com a diminuição do forçamento climático.
Eis mais uma inspiração para avançarmos mais rapidamente com nossas próprias discussões da fase P-8 dos pesados a diesel do Proconve (que andam em marcha lenta), para não ficarmos ainda mais para trás em relação aos países desenvolvidos que implementaram Euro 6 a partir de 2010 (há 8 anos!). Para os ônibus urbanos a diesel, as cidades de Santiago do Chile e do México adotaram a tecnologia Classe Euro 6 (que inclui o filtro de MP) como obrigatória, desde o início de 2018 para os ônibus urbanos novos a diesel que entram na frota. As montadoras brasileiras estão fornecendo os veículos Euro 6 para esses zelosos e exigentes clientes brindarem suas populações com um ar mais limpo, salvando vidas.
Enquanto isso, nossos fabricantes seguem despejando no mercado brasileiro e na contaminada cidade de São Paulo, os ônibus e caminhões Euro 5 defectivos, que apesar de muito caros, não trazem os benefícios ambientais esperados no tráfego das cidades, emitindo NOx nas ruas em quantidades muitos superiores aos níveis homologados em laboratório – o que, aliás, nos faz lembrar as fraudes do DieselGate na Europa e EUA. O próprio ICCT tem estudos técnicos consolidados publicados sobre esse lamentável fenômeno – ainda não corrigido no Brasil – que se observa nos veículos dotados de Euro 5 (Proconve P7).
Lembre-se finalmente, que a proposta de antecipação da compra exclusiva de ônibus Euro 6, em lugar dos defectivos Euro 5, é uma das propostas do recente documento de diretrizes essenciais para o transporte coletivo da Capital, proposto ao Executivo pelo Comitê do Clima do Município de São Paulo; a proposta também consta como recente recomendação do Secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Mauricio Brusadin, ao sistema de transporte público do âmbito do Estado de São Paulo – recomendação que esperamos seja materializada na prática das empresas de transporte que operam sob concessão governamental, para que a boa intenção não fique apenas no campo do proselitismo, em véspera de eleições.
Por fim, resta saber por que as autoridades ambientais e de transportes Chilenas e Mexicanas tem essa atitude de qualidade diferente, decidida, de colocar como prioridade a defesa da vida de seus cidadãos, e aqui no Brasil, admite-se a venda livre de uma tecnologia sabidamente fracassada, como Euro 5 ?
Esta é a pergunta, cuja resposta, gostaríamos de obter com ações positivas concretas dos governantes, em lugar de desculpas e justificativas implausíveis.
*Olimpio Alvares é diretor da L’Avis Eco-Service, especialista em transporte sustentável, inspeção técnica e emissões veiculares; concebeu o Projeto do Transporte Sustentável do Estado de São Paulo, o Programa de Inspeção Veicular e o Programa Nacional de Controle de Ruído de Veículos; fundador e Secretário Executivo da Comissão de Meio Ambiente da Associação Nacional de Transportes Públicos – ANTP; Diretor de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades – SOBRATT; consultor do Banco Mundial, da Comissão Andina de Fomento – CAF e do Sindicato dos Transportadores de Passageiros do Estado de São Paulo – SPUrbanuss; é membro titular do Comitê de Mudança do Clima da Prefeitura de São Paulo e coordenador de sua Comissão de Transportes e Energias Renováveis; colaborador do Conselho Nacional do Meio Ambiente – Conama, Instituto Saúde e Sustentabilidade, Instituto Mobilize, Clean Air Institute, World Resources Institute – WRI-Cidades, Climate and Clean Air Coalition – CCAC, do International Council on Clean Transportation – ICCT e do Ministério Público Federal; é ex-gerente da área de controle de emissões veiculares da Cetesb, onde atuou por 26 anos; faz parte da coordenação da Semana da Virada da Mobilidade.**Artigo originalmente publicado no site da ANTP.
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