Cerca de 7.500 bicicletas compartilhadas são hoje operadas pela Tembici, empresa nascida em 2016, mas criada a partir do projeto de graduação de três estudantes de engenharia da Universidade de São Paulo. Um deles, Maurício Villar, é hoje o diretor de Operações da tembici, atual responsável pelos maiores sistemas de bike-share do país. Villar tem dupla formação em engenharia mecatrônica, pela Poli-USP e pela "Ecole Centrale Marseille", de Paris.
Foi na Europa que ele vislumbrou a possibilidade de trazer ao Brasil o modelo de bicicletas públicas, que nasceu na Holanda nos anos 1970, consolidou-se na Dinamarca, por volta de 1997, chegou a Paris na virada do milênio e de lá se espalhou pelo mundo. Nesta entrevista ao Mobilize, realizada na sede da tembici, em São Paulo, Villar fala sobre o processo de modernização tecnológica dos sistemas de várias capitais e anuncia a implantação de uma fábrica de bikes na cidade de Extrema, sul de Minas Gerais.
Você poderia explicar quais são as inovações do sistema e das bicicletas?
Nós pesquisamos vários modelos de compartilhamento, em vários países, e concluímos que a tecnologia da canadense PBSC Urban Solutions é a mais robusta para atender às cidades brasileiras. As bicicletas são feitas com peças diferenciadas, mais resistentes, com um padrão diferente, o que desestimula os furtos e o vandalismo. O sistema de freios é mais seguro, porque funciona nos eixos, evitando os desajustes que normalmente ocorrem nos freios comuns de bicicletas. E tem luzes de segurança, acionadas por um dínamo interno. As estações também são desenhadas de forma a abrigar as rodas dianteiras, o que aumenta a segurança. A empresa já tem cerca de 50 mil bicicletas rodando em mais de 20 cidades do mundo. E nossa experiência em Recife mostrou que em três meses de operação não tivemos nenhum furto.
Ainda em relação à tecnologia, como é feita a conexão entre as estações, a central de operações e os usuários? Hoje o sistema tem muitas falhas...
Quando adquirimos a empresa Samba, também trouxemos a equipe técnica deles. E procuramos entender a origem dos problemas que eram relatados pelos usuários. Essas falhas acontecem por uma série de fatores, não apenas pela comunicação. Pode ser um problema no chip da bicicleta, nos circuitos internos da estação, na rede de celular ou uma simples falha na bateria da estação, problema frequente no sistema antigo. O novo sistema também é alimentado por painéis fotovoltaicos, mas a bateria de armazenamento é muito mais robusta. Em Recife, nesses três meses de operação, não trocamos nenhuma bateria.
Estações do novo BikePE, em Recife: bicicletas, estações e sistema de energia Foto: Luis Fabiano
Quais são as cidades que estão mais próximas de receber essa renovação do sistema?
Porto Alegre provavelmente será a próxima, mas estamos trabalhando para que todas as capitais que têm patrocínio do Itaú passem pela renovação nos próximos três meses.
Em São Paulo, o BikeSampa foi implantado na gestão do prefeito Gilberto Kassab, que também criou algumas ciclovias na cidade. Depois, na gestão Haddad, a cidade ganhou um impulso em toda a infraestrutura cicloviária, incluindo o sistema de bicicletas compartilhadas. O prefeito atual não parece ser um grande entusiasta da bicicleta. Como está essa negociação com a prefeitura? E como garantir ciclovias e ciclofaixas para que as pessoas possam pedalar com segurança?
Nós trabalhamos para mostrar que a bicicleta é a forma mais eficiente, barata, saudável e também alegre de transporte urbano. Procuramos levar dados objetivos quando apresentamos nossa proposta. Não faz sentido vincular a bicicleta a um partido ou a uma ideologia. E qualquer gestor público inteligente compreende que as cidades só têm a ganhar com o uso mais intensivo das bikes.
Por que a tembici decidiu fabricar as bicicletas aqui no Brasil?
Até agora estamos trabalhando com bikes produzidas no Canadá pela PBSC, já que eles tinham bicicletas suficientes em estoque. Em função dos planos de expansão que temos, nós concluímos que poderíamos ter problemas de prazo se tivéssemos que importar todas as bicicletas e estações. Fabricando no Brasil, reduzimos os custos de importação e por isso decidimos implantar uma unidade em Extrema (MG), cidade que nos ofereceu boas condições. Vamos iniciar produzindo mil bicicletas por mês para atender aos compromissos que já temos com os sistemas do Itaú e de outros patrocinadores. Mas pretendemos ampliar essa produção, porque temos exclusividade na tecnologia da PBSC para toda a América do Sul.
Uma reclamação comum, em várias cidades, é a falta de bicicletas compartilhadas nos bairros mais distantes. Agora, com a nova operação, as cidades terão estações nas periferias?
Em qualquer sistema de bike-share um fator importante é que as estações sejam próximas entre si para aumentar o número de viagens. O padrão internacional é que as estações estejam em média distantes 300 metros. E tecnicamente os sistemas de compartilhamento precisam dessa concentração para maior eficiência. A ideia é sempre colocar as estações nas áreas onde as pessoas trabalham ou estudam, onde estão concentrados os escritórios, restaurantes, escolas e outros centros de interesse, de forma que as pessoas usem as bikes para esses deslocamentos curtos. As pessoas podem sair com suas próprias bicicletas para ir até a estação do transporte de massa, onde deve haver um estacionamento seguro para as bikes. Depois de sair do metrô, do trem, ou do ônibus, as pessoas podem utilizar as bicicletas compartilhadas para completar a viagem. Um bom exemplo é o Eco-Bici, da Cidade do México, que tem uma grande concentração.
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