Já se vão quase três anos desde que a Prefeitura do Recife implantou a chamada Zona 30, área de velocidade controlada criada em 22 ruas do Bairro do Recife, no Centro da capital.
No início, o município faturou publicamente com a novidade, inspirada no modelo europeu de adotar políticas e equipamentos que priorizam o pedestre e forçam os veículos motorizados a reduzir a velocidade – o chamado traffic calm. Em junho de 2014, o projeto já era criticado por se resumir a alguns totens ilustrativos e a dois equipamentos de fiscalização eletrônica para flagrar o excesso de velocidade dos carros. O tempo passou e, infelizmente, nada mudou. A Zona 30 do Recife continua parecendo de mentirinha.
Se não fosse pelas placas indicativas de 30 km/h limitando a velocidade máxima permitida para os veículos em algumas das principais ruas do Bairro do Recife, quem passa pela região sequer percebe que ali funciona o único projeto de Zona 30 da capital. Nem mesmo os totens ilustrativos resistiram ao tempo e à ausência de manutenção. Os que ainda estão em pé, encontram-se apagados, sem que o cidadão consiga identificar com clareza as ruas que compõem o projeto. A Zona 30 foi implantada na área formada pela Avenida Alfredo Lisboa, Cais da Alfândega, Cais do Apolo e Rua do Observatório, totalizando 155.300 m2.
Bairro do Recife continua sendo uma ilha de carros estacionados por todos os lados. Foto: Bobby Fabisak/JC
Oficialmente, a prefeitura define a Zona 30 como “um conceito inédito em Pernambuco constituindo um espaço diferenciado de convivência do pedestre, da bicicleta e do carro”. Mas quem passa pela área sente dificuldades em perceber esse “clima de harmonia e compartilhamento das vias” a que se refere a gestão pública.
Com exceção do cruzamento da Avenida Marquês de Olinda com a Rua Madre de Deus, onde existem os dois únicos controladores de velocidade do bairro, nas outras vias os motoristas desenvolvem a velocidade que bem entendem, sem que sofram punição.
“A prefeitura se limitou aos totens e a esses dois equipamentos de fiscalização. Nas outras ruas do projeto não há nada. O Bairro do Recife continua sendo uma ilha de carros, com ruas sem qualquer prioridade ao pedestre e tomadas por veículos estacionados dos dois lados. O local não é pensado para as pessoas, não há estímulo para isso. Quem trabalha no bairro sabe o perigo que é circular após às 19h. A prefeitura desperdiça uma excelente oportunidade de pedestrianizar e arborizar ruas para estimular a vida no bairro”, critica o servidor público Cezar Martins.
Apenas em dois pontos do bairro há equipamentos de fiscalização eletrônica para reduzir velocidade dos veículos. Foto: Bobby Fabisak/JC
Pedestres
Quem circula pela área constata que o pedestre continua sem vez na região. As passarelas elevadas de travessia são raras na região e é comum encontrar veículos estacionados sobre elas. A única rua que recebeu um tratamento diferenciado para priorizar o pedestre foi a Rua da Moeda, ainda em gestões anteriores, sem que o modelo fosse reproduzido pelo bairro. Ao contrário, no lugar de elevar as travessias, a gestão tem rebaixado as faixas, colocando o pedestre na altura dos veículos. Nem mesmo o vão existente entre a rua e o meio-fio, criado por anos de execução errada do pavimento, foi solucionado pela prefeitura. São armadilhas criadas para quem anda de bicicleta e também para os pedestres.
Boulervard
A grande expectativa para o Bairro do Recife está na conclusão das obras da Avenida Rio Branco, uma das mais importantes da região, que vai ser transformada numa alameda – o primeiro boulevard da cidade. As obras começaram no fim de 2016 e a previsão é de que sejam concluídas no segundo semestre. A requalificação prevê a construção de novas calçadas, mantendo a característica original dos desenhos de pedra mineira, embutimento da fiação elétrica e a transformação do passeio público em um espaço destinado à circulação de pedestres e modais não motorizados. O custo é de quase R$ 5 milhões.
Até a sinalização de segurança de pedestres está apagada em ruas importantes do bairro. Foto: Bobby Fabisak/JC
O que diz a Prefeitura
A Autarquia de Trânsito e Transporte Urbano do Recife (CTTU) discorda da ineficiência da Zona 30 no Bairro do Recife e define o projeto como um conceito inédito em Pernambuco, que constitui um espaço diferenciado de convivência do pedestre, da bicicleta e do carro. O órgão não deu entrevista sobre o tema, mas nas informações enviadas à reportagem diz que implantou 60 totens com a indicação das vias que integram a Zona 30, placas regulamentando a velocidade de 30km/h e pictogramas (sinalização horizontal), que estão espalhados em locais estratégicos das vias contempladas pelo projeto.
“Além disso, com o intuito e garantir o respeito a velocidade regulamentada nas vias que possuem o maior volume de tráfego, a CTTU implantou dois equipamentos de fiscalização eletrônica no cruzamento da Avenida Marquês de Olinda com a Rua Madre de Deus. Os equipamentos fiscalizam infrações como excesso de velocidade, parada sobre faixa de pedestre e avanço de semáforo. Esses dois pontos também possuem faixas de pedestres iluminadas, garantindo uma maior visibilidade aos pedestres durante a travessia no período noturno”, destaca o texto.
Quanto à fiscalização da Zona 30, a CTTU informa que mantém uma equipe fixa de 12 agentes de trânsito atuando no Bairro do Recife, que além de orientar a população, também realiza o trabalho de fiscalização coibindo infrações como estacionamento sobre calçada. O órgão argumenta, ainda, que o projeto tem reeducado os motoristas. Os equipamentos de fiscalização eletrônica registraram, nos seis primeiros meses de validação das notificações, de setembro de 2014 a fevereiro de 2015, uma redução de 91% no número de multas aplicadas, passando de 12.861 no primeiro mês para 1.130 no sexto mês. Também houve uma redução de 76% na média mensal de multas aplicadas entre os anos de 2014 e 2016, como se pode observar nos dados disponibilizados abaixo.
Médias mensais das multas aplicadas por ano
2014- 7.171/média mensal
2015- 2.197/média mensal
2016- 1.694/média mensal
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