Prefeitura do Rio quer baixar limite de velocidade no BRT e BRS

Ainda em estudo, medida busca reduzir acidentes nas faixas exclusivas para ônibus. Medições da reportagem flagraram várias infrações

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Fonte: O Globo  |  Autor: Selma Schimidt  |  Postado em: 16 de janeiro de 2017

No Rio, BRS deve passar de 50 km/h para 40 km/h

No Rio, BRS deve passar de 50 km/h para 40 km/h

créditos: Portal da Prefeitura do Rio

 

Num teste feito pelo jornal O Globo, um ônibus com o motorista em treinamento foi flagrado circulando a 77 km/h na Avenida Armando Lombardi, na Barra, na pista em direção a São Conrado. Acima dos 50 km/h (velocidade máxima permitida para os veículos de transporte público na cidade, exceto em 14 vias de tráfego rápido) e também do limite de 70 km/h para carros na avenida. 

 

O desrespeito às regras de trânsito na Barra é um retrato do que acontece em outras áreas da capital, como mostram as infrações registradas por radares e guardas municipais. Foram 1.081.383 multas por excesso de velocidade de janeiro a setembro de 2016, o que dá uma média de 3.961 por dia.

 

Entre os 79 decretos publicados no Diário Oficial pelo prefeito Marcelo Crivella no dia de sua posse, um fixa o prazo de 30 dias para a Secretaria de Transportes apresentar um plano para, até o fim do ano, reduzir o número de pardais (radares) e revisar os limites de velocidade. 

 

BRT e BRS com limite mais baixo de velocidade

Embora ressalte que o estudo ainda está em curso, o secretário Fernando Mac Dowell adianta que a velocidade nos corredores prioritários e exclusivos de ônibus deve diminuir. 

 

No caso do BRS (faixa prioritária para ônibus), deve passar de 50 km/h para 40 km/h. No BRT (corredor exclusivo), de 70 km/h para 60 km/h. Atualmente, só em alguns trechos do BRT, com alto índice de acidentes, a velocidade é de 60 km/h.

 

"Não pode haver sistemas de transporte para matar gente, como vem acontecendo. Os ônibus andam como uns malucos pelo BRS em horários sem tráfego. Com a velocidade de 40 km/h, se alguém for atropelado, se machuca, mas não morre. Existe um estudo da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) de São Paulo que indica 40 km/h como a velocidade ideal nos BRS", diz o secretário de Transportes. 

 

"Quanto ao BRT, quando eu era do Conselho da Cidade, consegui baixar a velocidade para 60 km/h. Mas depois puseram 70. Entre o tempo de percepção (do perigo) e o acionamento de freios, um ônibus do BRT leva 130 metros para parar", completa Mac Dowell.

 

Na Linha Vermelha, a 189 km/h 

A partir do estudo em curso, não há perspectiva de os limites de velocidade aumentarem no Centro — pelo contrário, argumenta o secretário Mac Dowell: "O Centro tem VLT e muita gente para atravessar as ruas. Não posso aumentar a velocidade e provocar um strike. A velocidade pode até diminuir."

 

Números da CET-Rio mostram que, em 2016, um veículo atingiu 189 km/h na Linha Vermelha, mais que o dobro do permitido (90 km/h). Outro foi flagrado a 149 km/h no Túnel Vice-Presidente José de Alencar, na Grota Funda, onde o limite é de 80 km/h. Na Rua Maxwell, em Vila Isabel, um motorista estava a 133 km/h em vez dos 60 permitidos. E, na Estrada Marechal Alencastro, em Anchieta, um carro foi multado por estar a 110 km/h, quando não poderia passar dos 50.

 

Acompanhada do pesquisador Vinicius Côrtes, do Laboratório de Acústica e Vibrações da Coppe/UFRJ, e com o auxílio de um aparelho (os resultados são em milhas, que têm de ser convertidas em quilômetros), uma equipe do Globo foi a campo medir a velocidade de veículos, em dias úteis e fora dos horários de rush. No Aterro, próximo à Rua Dois de Dezembro e longe dos radares, um carro estava a 109 km/h.

 

Em cada um dos seis pontos avaliados, a velocidade foi medida durante um minuto, cinco vezes. Do total de 30 medições feitas, em 17 houve pelo menos um veículo trafegando acima da velocidade permitida. No Aterro, nas cinco avaliações, no mínimo um veículo cometeu a infração. No BRS da Avenida Nossa Senhora de Copacabana, próximo à Rua República do Peru, só em uma das cinco medições os ônibus estavam dentro do máximo permitido (50 km/h).

 

"Cuidado. Os ônibus passam voando por aqui", advertiu um pedestre ao ver a equipe.

 

No BRS da Rua Vinte e Quatro de Maio, no Rocha, e na Avenida Horácio Macedo, no Fundão, em todas as cinco medições, pelo menos um veículo foi flagrado cometendo a infração. Com trânsito mais intenso, na Avenida Epitácio Pessoa, próximo ao Corte de Cantagalo, na Lagoa, e na Avenida Vieira Souto, nas imediações da Rua Farme de Amoedo, em Ipanema, também houve problemas: no primeiro ponto, em duas medições foi constatado o excesso de velocidade; no segundo, em uma das avaliações.

 

O Globo fez ainda uma segunda medição. Desta vez, foram escolhidos dez pontos e, em cada um deles, selecionados aleatoriamente dez veículos. Nas cem avaliações, 48 estavam acima do máximo permitido. Na Autoestrada Lagoa-Barra, próximo à Estrada da Gávea 640, um carro trafegava a 97 km/h, 17 acima do limite.

 

Segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), o trânsito matou na cidade 447 pessoas — mais de uma por dia — de janeiro a novembro do ano passado. Mais do que os 432 mortos em igual período de 2015. Já os feridos no tráfego somaram 15.343 nos 11 primeiros meses de 2016, menos que os 17.264 do ano anterior.

 

Multas

As últimas informações disponíveis na CET-Rio revelam que o excesso de velocidade foi responsável por 44,78% do total de multas aplicadas (2,43 milhões) de janeiro a setembro de 2016, infrações anotadas tanto por equipamentos eletrônicos como por guardas municipais. E muitos desses radares foram desligados no fim do ano passado. Por causa de contratos que se encerraram, 365 equipamentos não estão funcionando. Segundo a CET-Rio, outros 561 estão ligados para flagrar não apenas excesso de velocidade, como avanço de sinais e invasão de faixas de BRS e BRT.

 

Mac Dowell confirma que o número de pardais será reduzido. E alega que não quer que os equipamentos sejam uma máquina de fazer dinheiro:

 

"Não adianta ter centenas de pardais multando, se eles não estiverem ensinando nada a ninguém e o número de acidentes não diminuir. O que se tem que fazer é, a partir de um levantamento, colocar pardais onde há uma maior quantidade de acidentes ou atropelamentos", disse.

 

Para o funcionamento noturno dos equipamentos que medem avanço de sinais — só 49 são desligados entre 22h e 6h —, está sendo estudado um novo modelo.

 

"Por razões de segurança, as pessoas não podem ficar paradas à noite em sinal. Infelizmente", afirma o secretário.

 

Retirada dos pardais

Para especialistas em transporte e trânsito, retirar pardais no momento atual significaria estimular as infrações. Eles também são contrários a aumentar a velocidade. Concordam, porém, com reduções, além de ajustes no caso de vias em que as velocidades mudam abruptamente.

 

Para o professor de engenharia de transportes Ronaldo Balassiano, da Coppe/UFRJ, reduzir o número de pardais hoje seria um desserviço para a cidade. Ele cita a Avenida das Américas, na Barra, onde as mortes no trânsito diminuíram após a instalação de radares.

 

"Vejo nos pardais uma forma de tentar educar a população. Como a educação para o trânsito não é dada nas escolas, ou é abordada de forma embrionária, as pessoas só recebem essas noções quando vão tirar a carteira de habilitação. O processo deveria vir da base", afirma Balassiano, acrescentando que, no futuro, todos os veículos deveriam sair de fábrica com GPS, como acontece com os ônibus, permitindo que fossem monitorados em toda a cidade, sem a necessidade de pardais.

 

Ele defende ainda velocidades menores — exceto em vias de trânsito rápido — como forma de humanizar a cidade:

 

"Quando se reduz a velocidade para em torno de 50 km/h, tornamos as vias mais humanas, e menos acidentes vão ocorrer. Mesmo que aconteçam, serão acidentes com resultados mais amenos. Há de se pensar que nas vias passam carros, mas que existem pessoas nas calçadas. O prefeito não diz que vai governar para as pessoas? Então, vamos governar para as pessoas."

 

Já o professor José de Oliveira Guerra, do Departamento de Engenharia da Uerj, sugere uma maior uniformidade para as velocidades em corredores:

 

"O motorista que está no Rebouças, a uma velocidade de 90 km/h, por exemplo, tem de diminuir para 70 quando chega à orla da Lagoa. Isso gera uma certa confusão. Essas mudanças precisam ser minimizadas, para que os motoristas não sejam apanhados de surpresa", diz.

 

Contra o aumento da velocidade

Ex-coordenador do Programa de Redução de Acidentes de Trânsito do Ministério dos Transportes, Fernando Pedrosa é radicalmente contrário ao aumento de velocidade:

 

"Pelo padrão de comportamento dos motoristas brasileiros e, especialmente, os do Rio, os limites atuais são suficientes. Mais de 90% dos acidentes têm como causa uma ação do motorista: excesso de velocidade, falta de cinto de segurança, ultrapassagem indevida."

 

Coordenador da ONG Trânsito Amigo, o engenheiro Fernando Diniz, que perdeu o filho de 20 anos em 2003 num acidente na Barra, também destaca a velocidade como um problema:

 

"O ideal é que não houvesse pardais, mas os motoristas não respeitam o limite de velocidade, nem com pardais. O motorista brasileiro é intolerante. No Rio, é irreverente também. Não quer esperar. A vida não tem preço. Quem perde é que sabe o valor da perda", desabafa.

 

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